ENTREVISTA - Marina Silva, ex-senadora
Roldão Arruda
A ex-senadora Marina Silva (PV), terceira colocada na eleição presidencial do ano passado, passou ontem o dia dando entrevistas e participando de articulações políticas em São Paulo. Desde a campanha não encarava um período tão agitado. Ao contrário daquele momento, porém, ela não enfrenta um adversário fora do partido, mas no coração dele. Ao lado de militantes históricos e de recém-desembarcados no PV, reunidos no movimento chamado Transição Democrática, ela cobra a democratização do partido. Quer a realização de convenção e eleições para a escolha de nova diretoria ainda neste ano. Do lado de lá, o atual presidente, deputado José Luiz Penna, articula para continuar no cargo que ocupa desde 1999.
Na avaliação do presidente do PV, José Luiz Penna, há muita estridência nesse debate. Para ele, todos querem mudar o PV, havendo apenas divergência em torno do prazo.
Não se deve reduzir o rico processo de revitalização do partido a uma questão de prazo, embora seja muito importante. Afinal, há uma enorme diferença entre fazer a mudança nos próximos seis meses, como propomos, e em 12 meses. Se vencer a segunda hipótese, o processo será levado para 2012, um ano eleitoral, quando você trabalha a candidatura de prefeitos e vereadores ou fica discutindo questões internas. Mas o debate é mais abrangente do que isso. Trata-se do resgate de compromissos com os quais o PV já trabalhava quando me fez o convite para ingressar no partido, envolvendo a revisão programática, a reestruturação democrática e o lançamento de uma candidatura própria. A decisão da candidatura própria se cumpriu com sucesso. Em relação à revisão programática, também avançamos. A agenda que ficou para o período pós-eleitoral é a reestruturação do partido. O PV não pode continuar sendo um partido fechado.
Por que fechado? A direção diz que as filiações estão abertas.
Não é assim. Se alguém fizer uma pesquisa, verá que, entre todos os pedidos espontâneos de filiação, pouquíssimos estão sendo encaminhados. Quanto aos que conseguem se filiar, não encontram nenhuma dinâmica partidária, nenhum canal de discussão.
A senhora parece estar propondo a reforma do partido.
Não estou propondo. Estou me aliando ao pensamento de Fernando Gabeira, Alfredo Sirkis, Aspasia Camargo, Sérgio Xavier, Fábio Feldman, Eduardo Jorge, milhares de filiados e simpatizantes. A mudança é uma demanda viva. O partido, depois do processo grandioso da eleição presidencial, precisa se reelaborar, montar estruturas com plasticidade para receber novas contribuições. Outros partidos estão se reelaborando a partir do que viram.
O que viram?
Como é que uma candidatura que não tinha aliança, não tinha tempo na TV, não tinha estrutura, não tinha o discurso do poder pelo poder consegue quase 20 milhões de votos? Todo mundo está avaliando isso. Espero que o PV também o faça.
Não acha complicado demais mudar uma estrutura cristalizada em mais de duas décadas?
Se alguém tivesse me dito que, após 25 anos de existência, deve se manter uma estrutura na qual as comissões estaduais são nomeadas por um poder central, e que quem discorda dele pode sofrer ameaça, intervenção e até ser destituído, não teria me filiado.
Esse debate pode ter algum reflexo na eleição de 2014?
Não penso nisso. Para mim, seria mais cômodo ficar como rainha da Inglaterra, dizendo que somos todos irmãos, fazendo discurso de conveniência.
Se o debate não funcionar, a senhora pode deixar o PV?
Não se inicia um processo trabalhando com a hipótese da derrota. Estou vivendo com sinceridade o processo. Não podemos ficar nos enganando e dizendo que o partido está bem. Olha o que acontece em Manaus, onde o Amazonino Mendes (prefeito, filiado ao PTB), com todo o respeito pela sua pessoa e com toda divergência política, é tratado como amigo e o Marcos Barros (integrante do Movimento Marina Silva), como inimigo. Algo está errada. Em Mato Grosso, fazem alianças com inimigos históricos do Código Florestal. Esse PV não é o PV do Gabeira, nem do Fábio Feldman. Esse PV não é o PV da Marina.
Não acha que os dois lados podem sair perdendo no caso de uma dissidência?
Não. O PV ganha. Ele só não ganha com a fossilização das ideias e das estruturas.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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