terça-feira, 26 de julho de 2016

Questões não respondidas ofuscam o futuro (Marco Aurélio Nogueira)

Não foi somente a vitória de Rodrigo Maia na Câmara ou as pesquisas que, na última semana, mostraram que mais da metade dos brasileiros mostram-se favoráveis à finalização do impedimento de Dilma Rousseff. Foi isso, e mais um pouco.
O governo interino de Michel Temer começou a soldar suas partes e já não é tão combatido como antes. A eleição do novo presidente da Câmara – nascida de uma articulação política não fisiológica – deu ao governo uma oportunidade para se mexer com maior desenvoltura no Congresso. A frente contra o “golpe” continua ativa, mas já não exibe a mesma força de antes. Buscou-se reforçá-lo com os slogans “Fora, Temer” e “não reconheço governo golpista”, que não animaram a vida política. Sem ter a seu favor análises realistas que dessem consistência e credibilidade à ideia mesma de “golpe”, o movimento foi-se curvando aos dados duros da política, à vida cotidiana e aos novos problemas da agenda nacional, que magnetizam as lideranças. Hoje, salvo melhor juízo, os slogans “antigolpe” servem mais como música de fundo para atos localizados de protesto e reivindicação.
O próprio PT já não se empenha tanto. Continua a denunciar o “golpe” mais por dever de ofício que por convicção. Chegou mesmo a apoiar a eleição de Rodrigo Maia, que até ontem seria um dos líderes da “conspiração golpista”.
É verdade, também, que não surgiu qualquer onda de entusiasmo ou apoio ao novo governo. A sociedade parece anestesiada, à espera de atos que a ajudem a se reposicionar e, eventualmente, a se repactuar com a política e os políticos. Os cidadãos olham para o Executivo e o Legislativo com tédio, decepção e desdém, como se se tratasse de um planeta distante, cujas ameaças criam mal-estar.
Seria estranho se fosse diferente. Não há, a rigor, motivos para comemoração: a democracia funciona, seus ritos e instituições têm sido respeitados, mas o sistema não se mostra ágil o suficiente para responder às demandas e expectativas da sociedade. Seu descompasso vem junto com a indiferença social, que se mantém ativas graças à convicção de muitos cidadãos de que a política se tornou exclusivamente coisa de políticos sem caráter. É um cenário desfavorável, ainda que não seja imutável.
O governo interino concentra-se em compor sua base parlamentar e recuperar a economia, valendo-se da ideia de trazer de volta a “confiança” entre os políticos e entre os agentes econômicos. Acredita que, com tal procedimento, terá como obter a aprovação do impedimento definitivo de Dilma e, a partir de então, reorganizar seus apoios, seu ministério e suas políticas. Se der errado, Dilma pode voltar e aí o caos será completo.
O governo continua com muitas arestas: ainda não se “arredondou”. Se passar pela prova final do impeachment, é provável que continue a flutuar como um polígono convexo irregular, condicionado pela dificuldade de coordenar uma sociedade sem eixo, pela carência de articuladores competentes no Congresso, pelas pressões do fisiologismo.
A própria recuperação da economia não é certa. A equipe econômica é competente, está sintonizada com o mercado e conhece os meandros das contas públicas, mas os ajustes anticrise por ela concebidos terão de ser discutidos e aprovados no âmbito político, onde os obstáculos são imensos. Há, além disso, a situação geral do país, suas desigualdades sociais, seus sistemas públicos e suas políticas pouco eficazes, seus déficits em termos de infraestrutura e de produtividade.
O governo, porém, confia no tamanho do mercado interno e na força da economia brasileira, no peso estratégico do país no mundo e na desarticulação das grandes maiorias. Tem até como usar a seu favor, paradoxalmente, a própria crise política, agindo mediante negociações seletivas, privilegiando ora uns, ora outros dos mais de 30 partidos políticos, sem ser hostilizado pela oposição, que se mostra, hoje, desestruturada e confusa.
Essas, porém, são vantagens bastante relativas. A disjunção entre Estado e sociedade jamais favorecerá a democracia e o bom governo. Se, no momento atual, desponta um novo clima político, derivado da neutralização dos fatores desorganizadores que se infiltraram nos governos petistas, não há como saber de que modo o país seguirá em frente.
Haverá, no horizonte, algum movimento virtuoso para reformar a prática e a cultura dos políticos e de seus partidos, ajudando ao mesmo tempo a que se reduzam a fragmentação parlamentar, o fisiologismo, o alto custo das campanhas eleitorais? O novo governo trará consigo uma estrutura administrativa mais eficiente, novos hábitos, procedimentos e mentalidades, que auxiliem a que se racionalize e se aperfeiçoe a atuação do Estado? A democracia ganhará ímpeto mais substantivo e melhor qualidade? Que caminho seguirão os partidos para assimilar os efeitos da Lava Jato e bloquear os germes da “antipolítica” que ameaçam contaminar a população? Que esquerda emergirá da crise do PT?
Nenhuma dessas questões tem como ser hoje respondida.
O país pede por renovação nas práticas políticas e nas orientações governamentais. Poderá continuar a aceitar que isso não venha no curto prazo, mas não se mostra disposto a esperar tempo excessivo. Sociedades dinâmicas, heterogêneas, repletas de carecimentos e desejosas de direitos igualitários e oportunidades, como o Brasil, não costumam ser propriamente tolerantes.
A paralisia da esquerda, sua entrega mais à agitação que à elaboração política, despoja a democracia brasileira de um protagonista que faria a diferença. Especialmente porque, ao contrário do que se diz, não há uma “hegemonia de direita” no país, nem a vida política é tutelada pela “mídia monopolizada”. A sociedade é cada vez mais plural, os cidadãos estão soltos e individualizados, as correntes de opinião se manifestam livremente e a democracia política vigora. O jogo está aberto, para ser disputado por quem se mostrar qualificado teórica e politicamente.
Fonte: O Estado de São Paulo (24/07/16)

sábado, 23 de julho de 2016

Não precisamos de Salvadores (Bolívar Lamounier)

Os 13 anos e meio dos governos Lula e Dilma equivaleram a um doutorado na arte de destruir um país. Comprovaram, além de qualquer dúvida, que o Brasil não precisa de populistas — esse gênero de político que de tempos em tempos se apresenta como salvador da pátria. Precisamos, isso, sim, de líderes.
De líderes sérios, bem entendido: alfabetizados em economia e comprometidos com a busca de soluções realistas para os problemas do país. Líderes que respeitem as instituições e contribuam para seu fortalecimento. Mas não basta querer. Primeiro, precisamos compreender como a sociedade brasileira se deixou arrastar para tamanho desastre.
Como pôde permanecer passiva ante os desatinos perpetrados pelos dois governos petistas? Uma resposta consistente a essa indagação requer uma análise cuidadosa do que se passou desde a fase final do regime militar. Mas um recuo a alguns fatores históricos distantes pode ser útil. Nós, brasileiros, tendemos a pensar que todos os nossos males políticos se devem à colonização portuguesa e à cultura ibérica.
Por essa via, logo chegamos ao sebastianismo, uma predisposição cultural que supostamente herdamos da metrópole. O termo refere-se à angustiada esperança de que um dia um salvador virá pôr ordem na casa e nos conduzir a um estágio mais elevado de desenvolvimento econômico e social.
Convenhamos que é um caminho tortuoso para explicar a ascensão de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência, mas não há como não mencioná-la depois de tantos anos ouvindo falar no ‘carisma’ de Lula, no operário nordestino que iria redimir os pecados do país.
Mesmo nas camadas de renda média e alta, muita gente embarcou nessa história, suponho que movida por algum complexo de culpa de viver num país tão pobre e desigual. Mas o que realmente precisa ser lembrado a respeito da colonização portuguesa é que ela nos legou o Estado patrimonialista, cujos traços fundamentais estão aí à vista até hoje.
Patrimonialismo — lembrando aqui Os Donos do Poder, a obra clássica de Raymundo Faoro — é uma estrutura de Estado comandada por uma burocracia e uma classe política parasitárias.
Bloqueando o acesso de grupos autônomos ao governo e reservando o filé-mignon da atividade econômica para os ‘amigos do rei’, esse arcabouço de Estado dificultou por todos os meios um processo de crescimento baseado num verdadeiro mercado. Criou uma classe de empresários amestrados, que preferiam (e aqui Delfim Netto é a referência obrigatória) ‘mamar nas tetas’ do Estado a enfrentá-lo.
Com o tempo, o Estado patrimonialista tornou-se também corporativista. Desde a ditadura de Getúlio Vargas, o sindicalismo pelego, o funcionalismo público e um rosário de outros grupos, inclusive parte da universidade e da cultura, aprenderam o truque dos empresários, aconchegando-se sob os generosos seios do Estado. Farinha pouca, meu pirão primeiro.
No plano das ideias, esses grupos nunca se deixaram flagrar de calças curtas, como simples defensores gananciosos de seus interesses. Abrigaram-se sob guarda-chuvas ideológicos os mais variados, mas todos ‘progressistas’, claro. Foi assim que, entre nós, o adjetivo ‘progressista’ se tornou sinônimo de ‘antiliberal’, vale dizer, contra um setor privado forte, contra a concorrência e o lucro.
A favor da perpetuação da máquina de Estado patrimonialista, centralizadora e financiada por uma tributação extorsiva e regressiva. Mas, claro, nenhuma sociedade é estática. Bem ou mal, o Brasil se tornou um país medianamente industrializado, com uma população em rápido crescimento e um índice de urbanização altíssimo.
Mesmo sem uma classe média numerosa, em termos relativos a velha engrenagem estatal patrimonialista perdeu poder perante a sociedade. Como a modernização social e cultural não avançou o suficiente para quebrar a espinha dorsal do Leviatã patrimonialista, hoje o que vemos é uma autêntica pororoca. Institucionalmente, somos uma federação, mas, financeiramente, o poder central fica com a parte do leão.
Há 150 milhões de cidadãos habilitados a votar, mas essa força imensa ainda não consegue exigir eficiência e transparência dos governos, tanto assim que autoridades mal-intencionadas permitiram que uma quadrilha operasse dentro da maior empresa do país.
As grandes manifestações iniciadas em 2013 sugerem a existência de um rápido processo de politização — impulsionado pelas novas tecnologias da comunicação, entre outros fatores —; e temos também uma respeitável tradição de imprensa independente.
Fato é, no entanto, que essa força ascendente ainda não consegue ombrear com a nefanda combinação de patrimonialismo com corporativismo, à qual há de adicionar o sistema presidencialista de governo, de tempos em tempos revigorado pela tragicomédia do sebastianismo redentor e pela excrescência atual¬mente conhecida como ‘presidencialismo de coalizão’.
Durante 33 anos, de 1961 a 1994, as contas fecharam na marra, graças a uma série ininterrupta de superinflações. Mas esse truque também se exauriu. Agora, ou o ponto de equilíbrio se desloca no sentido da modernidade e cria anticorpos mais efetivos contra o populismo, ou permaneceremos expostos a desastres como o da era Lula-Dilma.
Minha interrogação inicial foi como o Brasil se deixou arrastar para o desastre dos últimos 13 anos e meio. Para bem respondê-la, é preciso relembrar alguns momentos do passado recente, desde o fim do regime militar. O prolongamento excessivo do regime — falo dos seis anos do general João Figueiredo, 1979-1984 — debilitou simultaneamente os dois lados, militares e civis.
Sem legitimidade e devorada pela maré montante da crise econômica engendrada durante o governo Geisel, a corporação militar perdeu a iniciativa política.
Do lado oposto, após duas décadas no papel de oposição simbólica e eleitoral ao regime, mas sem deter alavancas reais de poder, o núcleo de líderes civis chegou também desgastado ao dia D da transição, ou seja, à eleição de Tancredo Neves pelo Colégio Eleitoral, à morte dele em abril de 1985 e à posse de José Sarney na Presidência.
Na fase final do ciclo militar, esse núcleo era representado principalmente por Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Franco Montoro e Mário Covas, por novos nomes na geração ascendente, como Fernando Henrique Cardoso e José Serra, e por alguns outros que, embora alinhados ao governo, compreendiam a necessidade do retorno ao regime civil: Marco Maciel, Delfim Netto e Roberto Campos, notadamente.
Em retrospecto, é fácil perceber que a debilitação desse ‘centro’ facilitou o aparecimento de predadores — de lideranças novas empenhadas em desalojar o núcleo central —, entre as quais Lula e Leonel Brizola despontavam como os mais importantes. Foi esse o pano de fundo que levou à reforma partidária de 1970, marco inicial da formação do PT.
Inconsistência
Conscientes do enfraquecimento do regime militar e de sua provável condição minoritária no Colégio Eleitoral que elegeria o sucessor de Figueiredo, os estrategistas políticos do governo apostaram numa convergência entre seus interesses e os de Lula e Brizola, que lutavam para entrar no jogo com seu próprio partido, em vez de se integrar à frente de oposições agrupada no MDB.
Concebida nessa perspectiva, a reforma partidária de 1979 proporcionou a Lulauma posição com base na qual ele passaria a flanquear o centro já na eleição para governador de 1982.
Outros fatores para a decolagem do PT e de Lula foram a esquerdização da Igreja Católica, da Conferência Episcopal de Medellín de 1976 em diante, e a adesão da parcela dita ‘modernizadora’ do movimento sindical, de egressos da luta armada e, naturalmente, de numerosos professores e estudantes universitários.
Como se daria o convívio de tais grupos na coalizão de esquerda, que carecia de um denominador comum ideológico com um mínimo de consistência? Ora, a inconsistência foi exatamente o que tornou viável tal convívio; qualquer proposta consistente teria impedido a convivência. O PT não precisava e não poderia ter ideologia. Bastava-lhe a mitologia que tinha ao alcance da mão.
De um lado, Lula, paulatinamente construído como um Messias salvador. Do outro, o que o jornalista Josias de Souza chamou de historicídio: um discurso maniqueísta no qual a história brasileira era contada como uma perpétua luta de ‘nós, o povo’ contra ‘eles, a elite’. Àquela altura, meados dos anos 80, o comunismo soviético caminhava para o colapso.
Com ele, desapareceu praticamente no Brasil o anticomunismo, ou seja, a linha divisória que dificultava a aceitação de doutrinas socialistas pela Igreja e pelas parcelas da classe média que viviam torturadas pelo complexo de culpa de viver em condomínios confortáveis, como ilhas num mar de pobreza. O resto da história é conhecido.
Graças a Duda Mendonça e mais tarde a João Santana, o redentor saiu das catacumbas; continuou a falar como um populista redentor, a maldizer as elites, mas começou a trajar ternos elegantes. Chegando à Presidência, passou a se referir à economia estabilizada e pronta para crescer que recebeu do governo Fernando Henrique como uma ‘herança maldita’.
Depois veio o mensalão e a invenção de Dilma Rousseff, a supertecnocrata que iria fazer um governo ‘ainda melhor’ do que o dele. Em 2010, surfando a altíssima popularidade decorrente do crescimento atrelado ao surto das commodities, elegeu-a sem dificuldades; em 2014, precisou ‘fazer o diabo’, mas repetiu a dose.
O detalhe desagradável foi que naquele ponto o desastre econômico já estava à vista e o megaescândalo da corrupção na Petrobras lhe batia às portas. Em essência, o populismo é a combinação de dois males igualmente letais: irresponsabilidade econômica e desapreço pelas instituições da democracia. Como sistema de política econômica, é o voluntarismo do ‘líder’ levado ao nível do desatino.
Para atingir seus fins — geralmente designados como ‘proteção aos pobres’, ‘combate às elites’ ou ‘defesa da soberania nacional’ —, ignoram as restrições normais da gestão financeira, propelem os gastos públicos a níveis estratosféricos, dão de ombros para a inflação e intervêm despropositadamente na economia, mal disfarçando o prazer que sentem demonstrando ‘poder’ e ‘coragem’ perante o empresariado privado.
Na política, o populista imagina que a vitória eleitoral confira ao Executivo poder ilimitado e superioridade ética em relação aos outros dois poderes. A história, mais uma vez, mostra que esses ‘líderes’ não salvam a Pátria — ao contrário, terminam por levá-la ao desastre.”
(*) Bolívar Lamounier é sociólogo com doutorado em ciência política pela Universidade da Califórnia.
Revista Exame/Especial (maio de 2016)

O PT não leva a sério o golpe que denuncia (Eugênio Bucci)

Mas o que é que anda acontecendo com o tal Partido dos Trabalhadores (PT)?
Duas hipóteses. A primeira é simples, campestre, quase inocente. Se soar um tanto jocosa, a responsabilidade deve ser debitada ao objeto em questão, não ao humor de quem apenas toma notas. A piada vem da realidade, como logo se verá. A segunda hipótese parecerá menos cômica e mais trágica, mas, fique bem claro, não passa de uma hipótese. Passemos logo à primeira.
Hipótese número 1.
Não é como partido, mas como quadrilha de festa junina que o PT se movimenta. É como quadrilha que ele dança. Nhô Lula, embalado pelos trinados da sanfona e animado pelo gengibre do quentão, passa a mão direita no microfone e com a esquerda tira o chapéu de palha da cabeça para erguê-lo bem alto, como a pedir a atenção dos circunstantes. Quando atrai os olhares para si, estufa o peito e dá o alarme: “Olha o golpêêê!”.
Pronto, é o que basta. O volume da música se eleva. Os casais se excitam. Obediente ao comando de Nhô Lula, o cordão dos intelectuais, que cada vez aumenta mais, vai batendo as rangideiras de dois pés esquerdos contra a terra batida da roça ideológica, Ouve-se a cantilena de hermenêuticas dilmófilas e heurísticas temerofóbicas (“temer o Temer”) sobre as conspirações que o imperialismo, aliado à Polícia Federal, maquina contra a Constituição de 88 (que em 1988 o PT quis repudiar). “É golpe!”, entoa o cordão que serpenteia no terreiro da luta de classes, entre meneios de cabeça e repuxões de ombros. “É golpe para derrubar Nhá Rousseff”.
Com olhos de farol baixo, Nhô Lula assiste à cena extasiado. Não tem pressa, mas também não tem muita paciência. Começa a se enfarar com tanta firula constitucionalista e decide que é hora de tomar novo fôlego. Empunha o microfone outra vez, olha para o outro cordão ao seu dispor, o cordão dos parlamentares, e solta sua voz mais gutural, simulando o tom meio cochichado de um conchavo: “É mentirááá!”.
Nhô Lula dá risada com o alvoroço que provoca. Enquanto os intelectuais amuam, lá se vão os deputados federais de gravatas caipiras tomar parte na barraca da Câmara, a mesma que teria desferido o golpe inominável, o “golpe parlamentar”. Enquanto golpe havia, ficavam na deles. Agora que golpe é mentira, ei-los solícitos aos ritos legislativos. Alegres em seus saracoteios, votam em Rodrigo Maia para presidente. Maia é do DEM e até ontem praticava o golpismo torpe, mas agora, depois que Lula liberou geral, está repaginado em Nhô Rodrigo.
O cordão intelectual não contava com tamanha desinibição do cordão parlamentar, que entre um voto e outro sai em busca de novas alianças municipais com o PMDB. Nhô Rodrigo é o novo companheiro contra o inimigo maior, embora morto, o coroné Cunha. Viva Nhô Rodrigo! Viva o quentão! E dá-lhe sanfona. Alguém pede Tim Maia. “Que beleza é a natureza.” Que beleza é a quermesse parlamentar.
Nhô Lula resmunga. A farra está indo longe demais. Esse pessoal não se manca? Então, sem se levantar da cadeira, emite nova voz de comando: “É verdade!”.
Vixe Maria. Jesus amado. Um intelectual e um parlamentar, abraçados, giram sem sair do lugar. Nhô Lula toma um fartão e entrega o microfone à Sinhá Kátia Abreu, que bota um baita de um olho gordo naquele curral.
Corta.
(Antes de entrar na outra hipótese, convém recomendar que as crianças sejam retiradas da sala.)
Hipótese número 2.
Não, o PT não é uma quadrilha. O PT é um partido político. Pode parecer absurdo fazer tal afirmação assim a seco, mas, calma, é só uma hipótese. Acontece que o PT não é um partido de tipo comum, como diriam os cientistas desse campo tão pouco científico, mas um partido de tipo especial. Os partidos comuns dizem uma coisa e fazem outra. Os especiais, mais raros, dizem uma coisa e depois fazem exatamente o contrário da coisa dita. Um exemplo? Dilma um dia antes das eleições de 2014 e Dilma um dia depois das eleições de 2014.
Se a hipótese for verdadeira, quer dizer, se o PT for mesmo um partido de tipo especial, estará explicado por que – depois de mobilizar os seguidores na sua cruzada contra o “golpe”, depois de tantos discursos, cartazes, xingamentos, passeatas patrocinadas por centrais sindicais patrocinadas pelo governo, depois de tantos colóquios acadêmico-apostólicos – mandou seus deputados despejarem votos num presumido golpista (até ontem) para presidir a Câmara dos Deputados, a Casa que lançou a pedra fundamental do ato que (até ontem) era chamado de golpe. O PT falou uma coisa e fez o oposto. Tudo se encaixa.
Nesse ponto, surge uma dúvida de método. Ou bem o PT diz o que não pensa, ou bem não pensa no que faz. Se a legenda diz o que não pensa, conta mentiras deliberadas. Se não pensa no que faz, é irresponsável. A dúvida é insolúvel, pois as duas assertivas certamente não são de todo falsas e, para piorar, podem ser ambas simultaneamente verdadeiras.
Tentemos elucidar a equação por outro caminho. O PT afirma que há um golpe em curso. Se acredita mesmo nisso, há de acreditar também que a ordem democrática está em via de sofrer uma ruptura traumática das mais devastadoras, comprometendo a própria ordem democrática. Logo, o papel do partido, fosse ele coerente, deveria ser o de apontar a farsa (que tenta passar-se por democracia formal) e seguir denunciando os tais golpistas para desmascará-los e restaurar o Estado de Direito. Mas o PT fez precisamente o contrário: dá sua voluntariosa sustentação à escolha do novo presidente da Câmara, a quem chamava de golpista, e ainda posa de guardião da democracia.
Conclui-se que, na prática, o PT age como se não houvesse golpe nenhum. Portanto, quando fala em golpe, só pode ser da boca para fora. Quanto a ser quadrilha (de festa junina) ou partido político (de tipo especial), isso ainda carece de novas e mais profundas investigações empíricas e teóricas.
(*) Eugênio Bucci jornalista, é professor da ECA-USP
Fonte: O Estado de São Paulo (21/07/16)

quarta-feira, 20 de julho de 2016

A Câmara de Maia, Cunha e Costa Neto (Marcos Nobre)

Nos discursos como candidato e como presidente eleito da Câmara, Rodrigo Maia fez questão de repetir à exaustão que não seria um representante das cúpulas partidárias, mas das bases, de cada deputado e deputada. Prestou sua homenagem ao baixo centrão, condizente com a hesitação que acompanhou até o último momento a decisão do governo Temer de apoiar sua candidatura. O governo interino tem claro que um dos importantes fatores da instabilidade estrutural do sistema político está na descoordenação visível no baixo centrão e já deixou claro que o próximo objetivo é devolver o poder às hierarquias partidárias, único arranjo em que o presidente em exercício consegue efetivamente operar. Ou, em suas próprias palavras, depois desditas de maneira protocolar, como já virou hábito neopalaciano: "Eu quero desidratar essa coisa de centrão".
Com a eleição de Maia para a presidência da Câmara, mais um passo importante foi dado rumo à pax pemedebista de Temer. Falta medir agora o tamanho do passo. E da perna que o deu. Porque, ao contrário do que se propagou, Maia está longe de ser o anti-Eduardo Cunha em termos de sua trajetória recente. É mais do que conhecida sua sólida aliança política com Cunha nos últimos anos.
O que fez de Maia o anti-Cunha foi o projeto de empoderar as cúpulas partidárias do baixo centrão, essa mistura de baixo clero e centrão, dando condições para que retomem o poder e a autoridade sobre as bancadas perdidos por obra e graça de Eduardo Cunha. Quanto mais fragmentado o cenário partidário, quanto mais esburacadas as regras de fidelidade partidária, tanto mais políticos com mandato se movem segundo seus interesses mais imediatos. Anulam, simplesmente, o tipo de coordenação e de unidade de ação típico de partidos que funcionam. Ainda mais se encontram proteção e coordenação fora do alcance da própria hierarquia de seus partidos, em uma figura como Eduardo Cunha.
O objetivo de Temer é claro, mas o caminho está longe de desimpedido. O baixo centrão é um bloco de cerca de 220 votos dos 13 partidos sempre-governo - PP, PSD e tutti quanti. A base de que partiu a candidatura de Rodrigo Maia no primeiro turno da votação - os neogoverno de PSDB, DEM, PPS, mais o PSB - recebeu em seguida o apoio decisivo dos ex-governo - PT, PCdoB, PDT. Para alcançar a vitória expressiva que alcançou, bastavam então que 50 votos do baixo centrão mudassem de lado. Conseguiu isso com a adesão do PR. E conseguiu a adesão do PR porque o governo Temer entregou a quantidade necessária de fita adesiva.
Ainda assim, é muito significativo que não tenha ocorrido uma debandada no baixo centrão. Com o anúncio do apoio dos ex-governo e do PR, a contabilidade dizia que a vitória de Maia estava assegurada. A tendência de desagregação do bloco dos sempre-governo em um caso como esse seria o resultado óbvio. E, na hora da xepa, a troca de lado teria saído relativamente barata.
Isso talvez tivesse acontecido, não fosse por alguns elementos decisivos. O primeiro deles é uma obviedade que parece ter passado desapercebida: a eleição foi apenas para a presidência. Todo o restante da mesa diretora da Câmara permanece onde está, segundo a mesmíssima distribuição de poder estabelecida por Eduardo Cunha quando de sua eleição, em fevereiro de 2015. A mesa diretora atual deverá cumprir seu mandato até o final de janeiro de 2017.
É aí que a coesão dos 170 votos recebidos por Rogério Rosso no segundo turno da eleição para a presidência da Câmara mostra que o jogo em favor da recuperação de poder por parte das cúpulas partidárias está muito longe de estar jogado. O que Eduardo Cunha representa continua muito vivo na Câmara e não será nada fácil devolver o baixo centrão de volta às garrafas partidárias de antes. Porque, no fundo, o que caracteriza esse baixo centrão é justamente uma relação frouxa e oscilante entre as cúpulas partidárias e as bases parlamentares. As cúpulas são apoiadas quando conseguem convencer de que se trata de coordenar as ações em vista de um inimigo ou de um objetivo comum. Foi o que aconteceu no caso da votação do impeachment de Dilma Rousseff. É o que acontece quando se trata de combater o objetivo do governo Temer de dissolver o próprio baixo centrão. Mas a regra é impedir que as cúpulas partidárias acumulem poder e autoridade suficientes para impor condutas uniformes, assim como punições em caso de descumprimento da orientação hierárquica.
Rodrigo Maia ganhou seu lugar à cabeceira da mesa, mas terá de jogar com as cartas de Eduardo Cunha. Incluindo a carta na manga que é o líder do governo na Câmara, André Moura, com quem Maia tentou disputar a posição, mas sequer passou da fase de qualificação. Moura foi imposto a Temer pelo baixo centrão com requintes de humilhação. Foi feita a Temer a ameaça de criar a figura do "líder da maioria" caso Moura não fosse nomeado.
A rachadura no baixo centrão que deu essa vitória tão cheia de amarras a Rodrigo Maia foi realizada pelo PR. É o partido do 2o. vice-presidente da Câmara, deputado Giacobo, que, no primeiro turno de votação, obteve 59 votos. Mas é, antes de tudo, o partido do ex-deputado Valdemar Costa Neto. No rastro do mensalão, Costa Neto renunciou ao mandato de deputado em 2005. Foi novamente eleito deputado em 2006 e em 2010, tendo renunciado uma vez mais ao mandato apenas em 2013, após sua condenação a sete anos e dez meses de prisão no processo do mensalão.
Não obstante os obstáculos, Costa Neto continuou a dirigir seu partido como antes. No início de maio deste ano, recebeu o indulto que o livrou do cumprimento do restante de sua pena, já então em regime de prisão domiciliar. Após o impeachment, reapareceu para apoiar a participação do partido no governo Temer. E, agora, para decidir a eleição em favor de Rodrigo Maia.
Uma simples regra de três política pede que se imagine Eduardo Cunha enfrentando o mesmo tipo de obstáculos que Costa Neto. É só comparar o poderio de um e de outro para ver que o jogo da estabilização do governo Temer na Câmara está ainda longe de seu fim.
(*) Marcos Nobre é professor de filosofia política da Unicamp e pesquisador do Cebrap
Fonte: Valor Econômico (18/07/16)

terça-feira, 19 de julho de 2016

O pai dos turcos (por Marino Boeira)

Parece que está havendo muita pressa em apresentar a derrota do golpe militar na Turquia como uma vitória da democracia e da população civil contra os militares, pensando talvez no que acontece no Brasil. Esquecem os que assim pensam, que os militares turcos representam o segmento mais moderno e democrático da Turquia em oposição à velha herança islâmica do califado turco, enquanto o atual presidente, Erdogan, está aliado aos segmentos islâmicos religiosos.
Só para recordar foi Mustafá Kemal Atatürk, como comandante do Exército e Presidente da Turquia a partir de 1923, quem comandou o processo de democratização e secularização do país e por isso é chamado O Pai dos Turcos.
O legado mais duradouro de Kemal foi a sua campanha pela secularização e a ocidentalização que ele impôs à nação turca. O califado, antiga posição de liderança nominal na fé islâmica, detida pelos sultões otomanos), foi abolido em março de 1924, assim como o título de paxá . Os madraçais foram fechadas, as leis da charia foram substituídas por um código de lei baseado no da Suíça, com influências do código penal italiano e do código comercial alemão foram também adotados.
Num gesto particularmente marcante, Kemal passou a considerar o fez (o chapéu típico otomano) como um símbolo de feudalismo e baniu-o. Atatürk usava vestimentas em estilo ocidental, insistindo para que todos os turcos fizessem o mesmo. O véu para as mulheres foi banido, e elas foram encorajadas a usar vestidos ocidentais e a participar no mercado de trabalho. Em 1928, o governo decretou que o alfabeto árabe deveria ser substituído por um alfabeto latino modificado, que era mais fácil de aprender e de ensinar e que tornava a publicação mais fácil. Todos os cidadãos desde os 6 aos 40 anos de idade foram obrigados a frequentar a escola e aprender o novo alfabeto. A língua turca foi “purificada” pela remoção de muitas palavras do árabe e do persa e substituída por novas palavras turcas. Desde então, a língua árabe foi usada somente para assuntos religiosos (islâmicos), pois o Alcorão é escrito em árabe.
(*) Marino Boeira é professor universitário.
Fonte: Sul21 (19/07/16)

A abdicação da esquerda (Dani Rodrik)

Enquanto o mundo está atordoado com o choque do Brexit, começa a cair a ficha - para economistas e formuladores de políticas governamentais - que eles subestimaram substancialmente a fragilidade política da atual forma de globalização. A revolta popular que parece estar em curso está assumindo diversas e complicadas formas: reafirmação de identidades locais e nacionais, demanda por maior controle e responsabilização democráticas, rejeição a partidos políticos centristas e desconfiança em relação às elites e experts.
Essa reação era previsível. Alguns economistas, inclusive eu, de fato advertimos sobre as consequências de levar a globalização econômica para além dos limites das instituições que regulamentam, estabilizam e legitimam os mercados. A hiperglobalização do comércio e das finanças, destinada a criar mercados mundiais perfeitamente integrados, desagregou as sociedades nacionais.
A maior surpresa é, inquestionavelmente, a guinada para a direita pela qual se expressou a reação no campo político. Na Europa, são predominantemente nacionalistas e populistas nativistas que ascenderam à proeminência, tendo a esquerda avançado somente em alguns países, como Grécia e Espanha. Nos EUA, Donald Trump, um demagogo de direita, conseguiu ocupar o espaço do establishment republicano, ao passo que o esquerdista Bernie Sanders foi incapaz de predominar sobre a centrista Hillary Clinton.
Como admite a contragosto um novo e emergente consenso no establishment, a globalização acentua a divisão de classes entre, de um lado, os que detêm o preparo e os recursos para tirar proveito dos mercados mundiais e, de outro, os demais. Clivagens de renda e de classe, em contraste com cisões fundadas em identidade - com base em raça, etnia ou religião -, tradicionalmente fortalecem a esquerda política. Então, por que a esquerda foi incapaz de articular uma contestação política significativa à globalização?
Uma resposta tem a ver com o fato de que a imigração ofuscou outros "choques" globalizantes. A percepção de ameaça da entrada de grandes contingentes de migrantes e refugiados de países pobres com diferentes tradições culturais agrava clivagens de identidade que os políticos de extrema-direita estão excepcionalmente bem posicionados para explorar. Portanto, não é de surpreender que políticos de direita - de Trump a Marine Le Pen - envolvam suas mensagens de reafirmação nacional em elevado teor de simbolismo antimuçulmano.
As democracias latino-americanas constituem um contraste revelador. Esses países vivenciaram a globalização como um choque nos terrenos do comércio e do investimento estrangeiro, e não como um choque imigratório. A globalização tornou-se sinônimo das políticas do denominado Consenso de Washington e de abertura financeira. Assim, a reação populista na América Latina - no Brasil, Bolívia, Equador e, mais desastrosamente, na Venezuela - assumiu uma forma esquerdista.
A história é similar nas duas principais exceções à ressurgência da direita na Europa: Grécia e Espanha. Na Grécia, a cisão política foi a política de austeridade imposta pelas instituições europeias e pelo Fundo Monetário Internacional. Na Espanha, a maioria dos imigrantes até recentemente vinham de países latino-americanos culturalmente semelhantes. Nesses dois países, faltou à extrema-direita o terreno fértil de que dispunha em outros lugares.
Mas a experiência na América Latina e no Sul da Europa revela, talvez, a maior debilidade da esquerda: a ausência de um programa claro para remodelar o capitalismo e a globalização focando o Século XXI. Do Syriza na Grécia ao Partido dos Trabalhadores no Brasil, a esquerda não conseguiu criar ideias economicamente viáveis e politicamente populares, além das políticas mitigadoras, como as de transferências de renda.
A economistas e tecnocratas de esquerda cabe grande parte da culpa. Em vez de contribuir para esse tipo de programa, eles cederam muito facilmente ao fundamentalismo de mercado e incorporaram seus princípios centrais. Ainda pior: lideraram o movimento de hiperglobalização.
A entronização de livre mobilidade de capitais - especialmente do tipo de curto prazo - como norma de política governamental pela União Europeia, pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pelo FMI foi, sem dúvida, a decisão mais crucial para a economia mundial nas últimas décadas. Como mostrou Rawi Abdelal, professor na Harvard Business School, esse esforço foi liderado, no fim dos anos 1980 e início da década de 1990, não pelos ideólogos do livre mercado, mas por tecnocratas franceses como Jacques Delors (da Comissão Europeia) e Henri Chavranski (na OCDE), intimamente associados ao Partido Socialista na França. Da mesma forma, nos EUA, foram tecnocratas associados ao Partido Democrata, mais keynesiano, como Lawrence Summers, que lideraram a iniciativa por desregulamentação financeira.
Tecnocratas socialistas franceses parecem ter concluído, a partir da fracassada experiência de Mitterrand com o keynesianismo no início de 1980, que a gestão econômica nacional já não era mais possível, e que não havia nenhuma alternativa real à globalização financeira. O melhor que poderia ser feito era estabelecer normas em âmbito europeu e mundial, em vez de permitir que os países poderosos como a Alemanha ou os EUA impusessem suas próprias regras.
A boa notícia é que o vácuo intelectual da esquerda está sendo preenchido, e não há mais nenhuma razão para acreditar na tirania do "não há alternativas". Os políticos de esquerda têm cada vez menos razões para não recorrer a um "respeitável" poder de fogo acadêmico em economia.
Considere apenas alguns exemplos: Anat Admati e Simon Johnson têm defendido reformas bancárias radicais; Thomas Piketty e Tony Atkinson propuseram um amplo menu de políticas para lidar com a desigualdade em nível nacional; Mariana Mazzucato e Ha-Joon Chang escreveram criativamente sobre como mobilizar o setor público para promover inovação inclusiva; Joseph Stiglitz e José Antonio Ocampo propuseram reformas mundiais; Brad DeLong, Jeffrey Sachs e Lawrence Summers (o próprio!) têm argumentado em favor de investimento público de longo prazo em infraestrutura e na economia verde. Existem elementos suficientes aqui para construir uma resposta econômica programática da esquerda.
A diferença crucial entre a direita e a esquerda é que a direita prospera ao aprofundar divisões na sociedade - "nós" versus "eles" - enquanto a esquerda, quando bem sucedida, supera estas clivagens mediante reformas que representam pontes. Daí o paradoxo de que as ondas anteriores de reformas de esquerda - o keynesianismo, social-democracia, estado de bem-estar - salvaram o capitalismo de si mesmo e na prática tornaram, a si mesmas, supérfluas. Na ausência de renovada resposta, o campo ficará aberto para populistas e grupos de extrema-direita, que levarão o mundo - como sempre - a divisões mais profundas e conflitos mais frequentes. (Tradução de Sergio Blum).
(*) Dani Rodrik é professor de economia política internacional na Faculdade de Governo John F. Kennedy, de Harvard. É autor de "Economics Rules: The Rights and Wrongs of the Dismal Science". Copyright: Project Syndicate, 2016.
Fonte: Valor Econômico (18/07/16)

Psicanálise do Brasil (Rosiska Darcy de Oliveira)

Vivemos momento mais agudo da crise. Apalavra crise assombra o Brasil. Está em todas as bocas, nos sentimentos de fracasso e de falta de alternativa que nos afligem. Está em tantos fatos e sentimentos diversos e confusos que não encontra uma definição clara.
Os consultórios de psicanálise são frequentemente solicitados por situações de crise individual. Crise, nos indivíduos, é aquele momento em que alguém não pode mais ser quem era, ainda não pode ser outra pessoa e não pode, salvo morto ou delirante, deixar de ser. Habita então uma terra de ninguém em que não se tem outra escolha senão dar à luz a um novo eu, construído com o que nos é dado viver naquele momento. Quem não conheceu em sua própria trajetória um momento assim? Celebra-se depois de uma dura travessia o encontro com um eu melhor, mais verdadeiro, mais sólido, erguido sobre os escombros de falsas ilusões.
A matriz da crise que atinge a sociedade brasileira, no plano coletivo, se assemelha à matriz da crise individual. Perda de identidade, esfarelamento das ilusões e esperanças nutridas ao longo de anos em projetos, partidos, ideologias, na vaga certeza de sermos uma grande economia emergente, enfim o país do futuro que estaria chegando ao seu destino.
Nossos mitos estão sendo duramente confrontados à verdade: uma nação que nos últimos anos viveu uma farsa política, em que heróis eram bandidos e os bandidos os grandes heróis, invadido por uma corrupção metastática, à beira da falência moral e econômica, sustentado a duras penas por uma democracia que se eviscera para sobreviver.
O encontro com a verdade não pode ser senão doloroso e, no entanto, tudo isso é bom, é saudável, é promissor, único caminho possível para dar à luz um país verdadeiro. Mas, hoje ainda habitamos uma terra de ninguém.
O desnudamento da casta política pela Lava-Jato tem nos custado a reputação de um país de corruptos. O que somos e não somos. É quando vem à tona a evidência de um mundo político em decomposição que o sentimento de vergonha que invade os brasileiros revela-se ser o avesso dessa decomposição. É quando emergem as reservas de decência que são enormes no país onde a imensa maioria ganha a vida honestamente.
Vergonha, depressão são estados negativos que contêm em si mesmos os germens de uma mudança positiva, já em curso. São passagens estreitas, incontornáveis na travessia da impostura para a realidade.
Estamos no momento mais agudo da crise. Uma população triste, pessimista, desencantada. Cair na real cobra o preço da angústia pelo que está por vir. E, no entanto, estamos mudando para melhor, enfrentando a devastação do passado e o desmoronamento das vãs promessas sobre o futuro embutidas no estelionato eleitoral, confrontados à justa medida de nossas possibilidades presentes. Um novo país, redimensionado, está nascendo de sua própria crise.
É esse país em crise, confrontado às suas insuficiências, que vai receber os Jogos. A imprensa internacional tem nos pintado com as cores do inferno, talvez espelhando nossos próprios policiais que assim se apresentaram no aeroporto para receber os turistas. A voz da nossa depressão ecoa esse coral de Cassandras. O jornal “The New York Times” anunciou uma “catástrofe olímpica” e ilustrou a matéria com a foto de uma menina miserável que dorme na rua. Poderia ter sido fotografada em Nova York ou em qualquer outra grande cidade, o que em nada atenua o horror de sua miséria. A menina ilustra o desvalimento, nossa vergonhosa dívida social, não prenuncia uma catástrofe olímpica. Nos Estados Unidos, durante as Olimpíadas de Atlanta, os homeless também não encontraram um teto.
É preciso cuidado para que a voz da depressão não comece a nos autodescrever como um inferno que não somos. Tampouco somos um paraíso, já que o paraíso há muito desertou as grandes metrópoles do mundo. E não só elas.
Não se improvisa uma cidade e um país inexistentes. Assim como em crises individuais mobilizamos recursos que não pensávamos ter, no plano coletivo também dispomos de recursos insuspeitados que saberemos mobilizar. A voz da depressão joga contra, não colabora. Melhor que se cale.
Findos os Jogos, que chegam como uma festa surreal em que os convidados desembarcam em uma casa semidemolida por um imprevisto terremoto, mais do que antes seremos confrontados ao que é o nosso verdadeiro desafio: renascer de nossa própria crise, pôr de pé um país que faça sentido. Fazer sentido é de fato um fazer, o sentido não é dado. Esse fazer será a tocha que, depois dos Jogos, continuaremos a passar de mão em mão.
Fonte: O Globo (16/07/16)


domingo, 17 de julho de 2016

Tudo o que você queria saber da Turquia e tinha medo de perguntar (Guga Chacra)

Sei que a Turquia é complicada. Vou tentar fazer o possível neste post para explicar de uma forma um pouco mais simples. E peço desculpas pela demora. Mas fiquei até tarde na Globo News e, além disso, não tínhamos todas as informações. E escrevo de memória seguindo a minha teoria de que, se eu não lembro de alguma coisa que vou escrever, certamente quem ler tampouco vai lembrar.
O fim do Império Otomano
Primeiro, temos de saber um pouco da história da Turquia. Até a Primeira Guerra Mundial, existia o Império Otomano. Era um império multiétnico e multi-religioso. O comandante era o sultão, que, além de líder político, era líder religioso dos muçulmanos. Tinham muitos judeus e cristãos, especialmente em grandes cidades como Istambul, Izmir (Smyrna), Aleppo, Cairo, Beirute, Damasco, Salonica e Alexandria. A população era árabe, curda, armênia, turca, búlgara, grega e eslava.
O Império Otomano entrou em colapso depois da derrota na guerra. Seus territórios no mundo árabe foram divididos entre britânicos e franceses – hoje são Israel, Palestina, Síria, Egito (que já tinha uma certa autonomia), Líbano e Iraque. Os da Europa se tornaram independentes, em um processo que havia começado um pouco antes.
O Nascimento da Turquia
Restou o território da Anatólia e um pouco da Europa, que é a Turquia de hoje. Neste espaço, jovens militares comandados por Mustafa Kemal Ataturk decidiram criar uma nova nação. Um país republicano, laico e turco. Isto é, passaram a valorizar a etnia turca, ocidentalizaram o país, incluindo a escrita, acabaram com sultão e instituíram uma República. Eles eram muçulmanos, mas laicos. Acharam importante separar a religião do Estado, nos moldes franceses. Este processo se chamou “Revolução Kemalista”. Simbolicamente, retiraram a capital de Istambul e transferiram para Ancara, no centro da Anatólia.
Século 20 e a Turquia Ocidental
Ao longo do restante do século 20, os kemalistas dominaram a política turca. Seu partido é o CHP. Mas a grande base do movimento laico é o Exército, além das elites de Istambul, Ancara e Izmir (Smyrna). Quando houve problema, o Exército interveio e assumiu o poder, repassando para civis posteriormente.
Judeus Sefaradis, Armênios e Cristãos Ortodoxos
Talvez você se pergunte o que houve com as minorias religiosas. Os judeus seguiram vivendo em Istambul. Inclusive, são chamados de judeus sefaradis e falam ladino, que é uma língua próxima de um espanhol arcaico. Os armênios foram alvo de genocídio durante a primeira guerra. Os cristãos grego-ortodoxos do que hoje é a Turquia migraram em massa para a Grécia, embora ainda haja em Istambul uma expressiva minoria cristã e também o Patriarcado Ecumênico da Igreja Ortodoxa, às margens do Bósforo.
Importante frisar que os armênios foram perseguidos não propriamente por questões religiosas, mas étnicas. Era turco contra armênio, não muçulmano contra cristão.
Turquia equivale a México ou Argentina
A Turquia, para esclarecer, não é um país atrasado. Está em um patamar de desenvolvimento similar ao Brasil, México ou Argentina. Tem menos desigualdade social do Brasil e incomparavelmente menos violência urbana. Também tem menos pobreza.
Turquia e a OTAN
Não podemos esquecer também que a Turquia, ao longo da Guerra Fria, era um dos maiores aliados americanos e até hoje é integrante fundamental da OTAN, como é conhecida a aliança militar ocidental.
Erdogan e AKP e no poder
Mas vamos chegar logo a Recep Tayyp Erdogan. Ele fundou um partido chamado AKP. E o AKP tem um viés religioso. Não se trata de um extremismo religioso, como a Arábia Saudita. Erdogan não é wahabbita. É apenas uma pessoa religiosa em um país laico. Os kemalistas são muçulmanos que comem tranquilamente bacon e tomam cerveja durante o Ramadã. Erdogan e os membros do AKP jejuam.
E o AKP conseguiu vencer as eleições graças ao apoio de uma base mais religiosa no interior da Turquia somado ao, na época, elogiado desempenho de Erdogan como prefeito de Istambul. Houve, na época, uma certa cautela dos kemalistas. Odeio comparações porque podem ser mal interpretadas, mas foi similar ao momento que Lula e o PT chegaram ao poder no Brasil – aliás, foi o mesmo momento – 2002.
Política Externa de Erdogan
Erdogan assumiu como premiê (a Turquia é parlamentarista) e seu aliado Abdullah Gul como presidente. Ele superou o ceticismo ao fazer reformas importantes na economia, que geraram crescimento. Aliás, diferentemente do PT e de Lula, Erdogan nunca foi de esquerda em economia. Ele tem posições conservadoras não apenas em economia como em temas sociais. Em política externa, seu então chanceler Davutoglu buscou estabelecer boas relações com todos os seus vizinhos. Erdogan era amigo de Assad. Lembro de ir a Damasco e ver outdoor com a imagem do líder turco. Juro. Também era amigo de Israel, de Bush nos EUA, de todos. Inclusive, deixou a Turquia mais próxima da União Europeia com a estabilização da economia.
No fim de 2008, Erdogan mediava a paz entre Israel e a Síria. Só faltava assinar. Ele, Assad e Ehud Olmert, então premiê de Israel, poderiam receber o Nobel da Paz. O mundo, ou pelo menos o Oriente Médio, seria mais pacífico hoje. Em tempo, quem me disse que eles assinariam a paz foi o próprio Assad quando o entrevistei em Damasco.
Mas, na época, Israel entrou em guerra contra o Hamas na Faixa de Gaza. E os israelenses, obviamente, coordenaram com o Egito de Hosni Mubarak, que tem fronteira com Gaza. Mas não com Erdogan, que não tinha nada a ver com a história. Ainda assim, Erdogan ficou irritado. Em Genebra, brigou com o presidente de Israel, Shimon Peres.
Os curdos
Aos poucos, a partir de 2009, a Turquia, portanto, começou a mudar sua política externa. Internamente, porém, Erdogan buscava uma aproximação com os curdos. E aqui cabe uma explicação. Os curdos são uma etnia que também segue o islamismo sunita, como os turcos. Mas a religião não interessa. Interessa a etnia.
Os curdos nunca tiveram um país e se tornaram minoria na Turquia, Irã, Iraque e Síria. No caso turco, os kemalistas tinham esta política de o país ser uma república étnica turca. Os curdos não se encaixavam e não tinham direitos, incluindo o de estudar as línguas. Surgiram então movimentos separatistas curdos, como o PKK, que começaram a realizar atentados terroristas a partir do fim dos anos 1970 e começo dos 1980. Foram dezenas de milhares de mortos contra as forças turcas.
Primavera Árabe
Mas voltemos à política externa. A Turquia, que não é árabe, apostou na Primavera Árabe a partir de 2011. E apostou também que as nações árabes se tornariam democracias como a Turquia. Não apenas democracias. Democracias com participação do Islã político. No início, deu certo. A Irmandade Muçulmana assumiu o poder no Egito em eleições democráticas.
Na Síria, Erdogan fez a sua maior aposta. Abandonou seu ex-amigo Assad e passou a apoiar rebeldes da oposição. Mais do que isso. Começou a permitir que jihadistas de todo o mundo entrassem na Síria para lutar contra Assad. O regime de Assad, não podemos esquecer, é laico, mas conta com o apoio das minorias muçulmanas alauíta, cristã e drusa, além de sunitas não religiosos similares aos kemalistas. Erdogan queria uma democracia controlada por sunitas.
Para complicar, Assad concedeu uma certa autonomia aos curdos na fronteira com a Turquia. Estes curdos, que lutavam contra os jihadistas, mas não contra Assad, eram aliados dos curdos na Turquia, do PKK.
Política Doméstica de Erdogan
Internamente na Turquia, Erdogan passou a ter planos de se tornar presidente. Não apenas presidente. Mas presidente em um regime presidencialista, retirando poderes do premiê. Em 2014, ele atingiu seu objetivo se eleger presidente. Era fácil. Mas não obteve a super maioria para seu partido, o AKP, conseguir mudar a Constituição. Na prática, no entanto, Erdogan se tornou o grande líder da Turquia. O premiê passou a ser seu aliado de sempre, Davutoglu.
A oposição se divide entre os kemalistas, os nacionalistas e os curdos não ligados ao PKK. Dividida, não consegue evitar a consolidação no poder de Erdogan. O líder turco, porém, sempre paranoia com um outro grupo – os gulenistas.
Os gulenistas integram um movimento mais religioso que segue um líder atualmente exilado nos EUA. Eles são extremamente educados (no sentido de educação formal, acadêmica). Há membros em todos os setores da sociedade turca – militares, juízes, médicos, jornalistas, acadêmicos. Não há paralelo no mundo.
Erdogan sabe da influência dos gulenistas, que foram seus aliados no passado. E tem uma paranoia atualmente em relação a eles. Tanto que os acusa, em parte, pela tentativa de golpe.
Paranoia de Erdogan
Nos últimos tempos, a paranoia de Erdogan se agravou. Manda prender jornalistas que o criticam. Afasta juízes e generais. Censura a imprensa. O tempo todo acha que alguém trama contra ele. Externamente, Erdogan vinha agindo da mesma forma, ao entrar em atrito com a Rússia na Síria e seguir brigando com Israel e Assad – curiosamente, apesar de estar em lado antagônico na Guerra da Síria, Erdogan sempre manteve uma boa relação com o Irã, que, além de tudo, é xiita. Isso se deve ao comércio bilateral. Erdogan também se dá bem com os curdos do Iraque por causa do comércio.
ISIS (Estado Islâmico ou Daesh)
Dentro deste cenário, no ano passado, a Turquia começou a alterar sua política em relação aos jihadistas. O ISIS, também conhecido como Grupo Estado Islâmico ou Daesh, começou a realizar atentados terroristas. O país passou a integrar a coalizão liderada pelos EUA para combater a organização. Ao mesmo tempo, Erdogan também passou a bombardear os curdos da Síria que lutavam contra o ISIS.
O resultado foi o início de atentados terroristas na Turquia tanto do PKK como do ISIS, sendo o mais recente no aeroporto. Sua popularidade não foi tão atingida, com o AKP vencendo eleições. A base dele é forte e foi beneficiada pelo bom desempenho econômico, surgindo uma nova classe média.
Mudança de postura
Apesar disso, crescia a insatisfação em determinados setores das Forças Armadas e também da elite em Istambul. No exterior, a insatisfação de Erdogan era crescente. O líder turco soube ler especialmente o cenário externo (e em parte porque viu que até seu aliado Davutoglu o criticava e deixou o governo). Fez um acordo com a União Europeia para reduzir o número de refugiados e imigrantes cruzando da Turquia para a Grécia de barco. Também voltou a se aproximar da Rússia e de Israel. Alguns diziam até que Erdogan passaria a tolerar Assad para haver uma união maior contra o ISIS.
O Golpe
Mas certamente isso não foi suficiente para uma parcela das Forças Armadas. Na noite desta sexta-feira, levaram adiante um golpe militar. Incialmente, obtiveram sucesso. Erdogan, de férias no Mar de Marmara, convocou a população para ir as ruas contra os golpistas. O cenário, naquele momento, começou a se reverter.
Erdogan também teve o apoio externo imediato, com os EUA denunciando o golpe. Dentro da Turquia, os três principais partidos de oposição também disseram ser contra o golpe. Na Globo News, até comparei estes partidos ao PSDB e o DEM condenando o impeachment contra Dilma, mas esta comparação é descabida e peço perdão. Não deveria ter misturado as duas coisas ao vivo e sem contexto (se bem que pouca gente ligou). Mas, enfim, a condenação dos kemalistas, nacionalistas e curdos pesou muito. E, para completar, os gulenistas também condenaram
Neste momento, em uma situação fluída, parece que Erdogan saiu vencedor. Ou, pelo menos, não foi derrotado. Os golpistas parecem ter fracassado. Erdogan acusa os gulenistas, que negam. Outros falam em auto-golpe. Nada é impossível na Turquia de Erdogan, assim como na Rússia de Putin. Acho possível que organizasse um auto-golpe para se fortalecer. Mas creio que seria diferente do que vimos e não haveria centenas de mortos. Talvez, se tiver fugido do controle. Ainda assim, acho improvável.
O certo, apenas, é que uma parcela considerável do médio e baixo escalão das Forças Armadas da Turquia tentou derrubar Erdogan. E aparentemente fracassou. A Turquia, no entanto, independentemente do resultado final, será outra. Creio que pior. Sempre lembro da Venezuela depois do golpe que tentaram dar contra Chávez. O chavismo se radicalizou e ficou bem mais paranoico a partir daquele momento. O mesmo pode ocorrer com Erdogan. Mas estes temas ficam para outros posts e para os meus comentários na Globo News.
Guga Chacra, blogueiro de política internacional do Estadão e comentarista do programa Globo News Em Pauta em Nova York, é mestre em Relações Internacionais pela Universidade Columbia. Já foi correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Oriente Médio e em NY. No passado, trabalhou como correspondente da Folha em Buenos Aires
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16 Julho 2016