sábado, 19 de março de 2011

HISTÓRIA DA LITERATURA BRASILEIRA (Carlos Nejar)

Nejar traça "épico" sobre literatura brasileira
Volume reúne, em mais de mil páginas, os principais escritores do país, do Descobrimento aos dias de hoje

Autor gaúcho publica também "Os Viventes", conjunto de mais de 300 poemas que recriam a história da humanidade

Carlos Nejar divide os artistas em dois grupos: os que criam um pequeno jardim e os que fazem uma floresta.
Nejar optou pela floresta há 51 anos, ao lançar a coletânea de poemas "Sélesis", seu livro de estreia.
Desde então, o poeta, romancista, contista e crítico literário impôs-se uma tarefa nada singela: renovar o gênero épico, cujos modelos ocidentais por excelência são os poemas "Ilíada" e "Odisseia", atribuídos ao grego Homero.
Gaúcho de Porto Alegre, 72, há três anos no Rio de Janeiro, Nejar não desvincula a ambição do ato de criação.
"O artista não deve ser porta-voz do fracasso, do nada. Eu quero cantar a beleza, ser porta-voz da grandeza humana", diz.
No caso de Nejar, tal grandeza não é puramente uma questão de retórica poética, mas também algo tangível, pesado, com 1.106 páginas.
Caso o tamanho de "História da Literatura Brasileira", por si só, não impressione o leitor, há ainda o imponente subtítulo: "Da Carta de Caminha aos Contemporâneos".
Trata-se, diz, "de um livro sem precedentes no país".
Também pela editora Leya, a autor lança agora "Os Viventes", e não é mais modesto aqui.
Com mais de 300 poemas, a coletânea, explica ao autor, compõe "uma pequena "Divina Comédia'", espécie de painel da "condição humana" ao longo do tempo.

PRETENSÃO
Nejar, evidentemente, sabe vender bem o seu peixe, mas é difícil não pensar na palavra "épico" quando nos referimos à obra dele.
Lançada pela primeira vez em 2007, "História da Literatura Brasileira" consumiu mais de dez anos de pesquisa. Retorna agora com o dobro de páginas, quatro novos capítulos e a pretensão de mapear o que de mais significativo se produziu nas letras nacionais, do Descobrimento até hoje.
Estão lá, ao lado do português Caminha ("escreveu a primeira nomeação da nossa nacionalidade") e medalhões (Machado de Assis e Euclydes da Cunha), jovens autores como Daniel Galera e João Paulo Cuenca (ainda que apenas citados).
As histórias literárias anteriores, mesmo quando escritas por críticos renomados como Antonio Candido ou Alfredo Bosi, tinham para Nejar dois defeitos: ou abordavam apenas os autores já consagrados ou eram concisas demais.
No mais das vezes, eram também "muito didáticas, uma chatice".
O leitor perceberá que a nova versão de Nejar, no entanto, também tem lá suas idiossincrasias.
Autores hoje já esquecidos (Moacir Piza, Alceu Wamosy) ganham mais espaço que fortes nomes contemporâneos (como Milton Hatoum e Sérgio Sant'Anna, ambos apenas citados na lista de nomes surgidos após 1970).
Também não é incólume a erros. Michel Laub, por exemplo, surge como Lamb.
A seu favor, Nejar argumenta que o livro "é uma visão pessoal e amorosa, com coragem para enfrentar os escritores atuais e atacar mitos e igrejinhas".
Dos mitos fazem parte "A Pedra do Reino", livro de Ariano Suassuna que Nejar diz ser "obra confusa e ilegível", e a poesia concreta, "da qual não posso falar, porque é algo que não existe".

TIRO NO FUTURO
De um encontro com Nejar, saímos com a impressão de que ele incorporou o tom homérico na própria vida.
O poeta vive em frente ao mar da Urca, num local batizado de "Casa do Vento".
A decoração e a arquitetura da casa lembram o interior de um grande navio.
Elza, com quem está casado há 23 anos, recebeu dele o apelido de "Espanto".
Quando lê um poema, Nejar o faz com a eloquência que costumamos associar aos antigos trovadores.
"Não estou na moda, não sou badalado. Não sou um poeta fácil", resume ele.
Pois o Nejar crítico não tornará o Nejar poeta mais compreensível. "É claro que não me cito na "História da Literatura Brasileira". Não poderia falar de mim mesmo, seria muito cabotinismo."
Secretamente, contudo, sabe bem o papel épico (como sempre) que gostaria de ocupar com "Os Viventes", recriação poética da história da humanidade que resume 30 anos de trabalho do autor.
"Me enquadro na tradição de Cabral e Drummond. Eu atiro para o futuro."
Enquanto espera pelas glórias vindouras, Nejar não tem motivos para queixar-se.
""Os Viventes" é um livro único no panorama da poesia brasileira contemporânea, e quiçá em toda a nossa poesia", escreveu o poeta Ivan Junqueira.
Já o conterrâneo Tarso Genro lhe disse que a "História da Literatura..." apresenta uma "poetização genial".
Neste caso, Nejar viu-se obrigado a discordar de um dos dois termos usados pelo governador do Rio Grande do Sul. "Não há poetização ali", explicou.


FRASE

"A dita inteligência de certos especialistas tem prejudicado a crítica literária. Eles trocam a intuição pelo método, pela matéria morta da teoria. Não percebem que o importante na crítica é a intuição, a matéria viva da criação literária"
CARLOS NEJAR
escritor

RAIO-X
CARLOS NEJAR

VIDA
Nasceu em Porto Alegre (RS), em 1939. Atualmente vive no Rio de Janeiro. É membro da Academia Brasileira de Letras

OBRA
"Sélesis" (1960), "Danações" (1969), "Canga" (1971), "Um País, o Coração" (1980), "Rio Pampa" (2000)

PRÊMIOS
Prêmio Nacional de Poesia (1971), Prêmio de Poesia da Associação Paulista de Críticos (1999), Prêmio Machado de Assis (2000)
MARCO RODRIGO ALMEIDA
(Folha de São Paulo)

2 comentários:

  1. Tomara que eu crie coragem para ler e acreditar no trabalho A HISTÓRIA DA LITERATURA BRASILEIRA. Eu não sou crítico literário e me sinto mais com a vocação de historiador da literatura. Tomara que a coragem do autor em criticar abertamente a crítica universitária e afins possa ser um passo para o meu dilema de ser obrigado pela mesma universidade a ser um crítico literário.

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