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CASTANHA QUENTE -
Outra edição digna de aplausos foi ao ar na última terça-feira,
abordando o drama de milhares de crianças brasileiras que trabalham
trocentas horas por dia para sustentar suas famílias, a si mesmas e sob o
aplauso, principalmente da sociedade que as cerca. Um dos elementos que
sempre chama àtenção nas abordagens jornalísticas sobre o trabalho de
crianças é o bordão repetido por pais que defendem a importância do
trabalho de seus filhos e, coincidentemente, também repetido por muita
gente boa que vive muito bem e que não sabe o que é colocar seus
rebentos para trabalhar descascando castanhas torradas ainda quentes,
catando mariscos ou arrastando pesados carrinhos de compras em feiras
livres, cenas comuns na infância pobre do Nordeste. Todos têm um
argumento de defesa na ponta da língua: ‘ah, mas é melhor a criança
estar trabalhando do que roubando, do que pegando no que é alheio ou se
prostituindo’.
Ora, como bem enfatizou o Profissão Repórter da
última terça, quem foi que estabeleceu esta lógica perversa segundo a
qual toda e qualquer criança pobre só tem essas duas escolhas: o
trabalho ou o roubo, no caso dos meninos, ou a prostituição, no caso das
meninas? O discurso, incorporado acriticamente pelos pais, para quem
colocar os filhos para trabalhar nos primeiros anos de vida é prêmio e
proteção, não permite compreender que crianças tratadas com normalidade
pelo mundo não precisam trabalhar cedo e nem por isso se tornam ladrões
nem prostitutas. Vão para a escola.
Malu Fontes é
jornalista, doutora em Comunicação e Cultura e professora da
Facom-UFBA. Texto publicado originalmente em 15 de julho de 2012, no
jornal A Tarde, Caderno 2, p. 05, Salvador/BA; maluzes@gmail.com
A Tarde/BA
15/07/2012
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