domingo, 15 de julho de 2012

A HORA DE CALAR E A HORA DA VERDADE (Juca Magalhães)

Entrevista concedida por Juca Magalhães a Elis Carvalho do jornal A Tribuna.

Achou que a pena de dezenove anos foi justa?

Acho que a pena aplicada ao Narcizo foi justa. Injusto é o tempo que ela levou para ser decretada. O réu tem amplo direito à defesa e todo tipo de recursos para demonstrar sua inocência. Porém, o que teve a vítima Maria Nilce e sua família por parte do Estado Brasileiro e da justiça nesses 23 anos? Qual foi a resposta que tivemos? E a sociedade, o conjunto de pessoas que forma o Estado do Espírito Santo, o que teve? Como será que esse tipo de crime e sua flagrante impunidade repercute para as pessoas de bem e para os criminosos? São questões a se ponderar, não é? Todo esse processo envia mensagens para o povo: noção de ação e reação, crime e castigo. Qual o recado que a justiça tem nos dado desde então? Vendo por esse lado é uma situação socialmente lamentável e pode seguramente ajudar a explicar o atual crescimento da violência.

Durante seu julgamento o acusado Cezar Narciso disse que o crime de Maria Nilce estigmatizou sua vida, que ele passou a ser conhecido em São Mateus – cidade onde reside - como "o matador de Maria Nilce". Pois cabe perguntar, qual foi o estigma da família de Maria Nilce desde então? Quando um crime fica em aberto, sem solução, sem resposta concreta e imediata abre-se campo para todo o tipo de especulações e comentários maldosos que sempre querem desclassificar, curiosamente, a vítima. Por que será que em Vitória Maria Nilce só é lembrada pela mídia como uma pessoa "polêmica", para dizer o mínimo? Ora, ela era mãe, empresária, uma mulher à frente de seu tempo. Era jornalista conhecida nacionalmente por sua beleza e competência, tinha cinco livros publicados e escrevia diariamente a coluna social mais lida do estado no momento em que morreu (5 de julho de 1989). Então ela era só uma pessoa polêmica?

Como avalia a atuação da promotoria?

A Dra. Carla Mendonça que atuou na promotoria do caso demonstrou ser uma profissional firme, determinada e muito aplicada aos estudos. Basta levarmos em consideração que ela teve apenas quinze dias para se inteirar de todo o processo que é, para dizer o mínimo, quilométrico e bastante intrincado. Sua atuação foi clara, direta e sem apelos emotivos ou grandiloquentes. Muito diferente do advogado da defesa que por duas ocasiões disse que não ia “denegrir” a vítima, mas o tempo todo olhava para nosso lado como se pensasse em o fazer, parecia lamentar inibido nossa presença. No pior destes momentos chegou a bater em cima do processo e dizer algo como: se eu for falar o que tem sobre Maria Nilce aqui... Deveria ter se concentrado mais em conseguir provar a inocência de seu cliente que, por essas e outras, acabou condenado. Fico pensando quantas vezes esses advogados “de porta de cadeia”, para encher lingüiça em suas preleções de hora e meia, não ficaram falando bobagens e inventando fofocas sobre Maria Nilce para desviar a atenção do júri e emprestar um verniz de lógica aos crimes injustificáveis de seus clientes.

Narcizo vai continuar solto até a decisão final, pois respondeu todo o processo em liberdade. Você teme uma fuga como ocorreu com Adreatta?

Não entendo como pessoas que já foram claramente tipificadas como "ameaças à sociedade" possam estar soltas livremente por aí. É o caso do mandante condenado José Alayr Andreata e agora do Narcizo. Se formos pensar bem a justiça põe a vida em risco dos jurados do processo, dos familiares da vítima, da promotora. Ou será que não existe o perigo de sofrermos algum tipo de coação, vingança ou represália? É assim que a justiça protege os inocentes? Por outro lado essa condenação é importante, porque ela esclarece e determina uma situação. Mesmo com o recurso, a partir daquele momento a pessoa passa a ser não mais um acusado, mas um condenado. E se empreender a fuga terá que viver uma vida na clandestinidade sem os mesmos direitos de um cidadão de bem.

Hoje temos livre um homem perigoso como o Ex-Delegado Claudio Guerra, que tanto contribuiu para o tumulto das investigações desse caso. A promotora Carla Mendonça relatou que várias peças e páginas do processo do caso Maria Nilce simplesmente desapareceram ao longo desse tempo, inclusive uma fita contendo a gravação e sua respectiva transcrição feita com o pistoleiro José Sasso - morto em 1992 como “queima de arquivo” - na qual ele confessava o crime e a participação de outros acusados como o Andreatta. Essa gravação teria sido feita por um policial civil conhecido como Pêjota que resolvera atuar como informante da polícia Federal e que posteriormente foi também assassinado. Esse é um crime “de repercussão nacional” que deixou um rastro enorme de outros crimes, com um custo muito alto em vidas e reputações. O advogado de defesa afirmou ter feito um cálculo, baseado em declarações de época, de que o montante operacional do assassinato de Maria Nilce teria sido orçado em mais de oito milhões e duzentos mil reais, atualizados os respectivos valores.

Qual a expectativa pelo julgamento do Japonês em novembro?

Ontem durante o julgamento do caso Maria Nilce, o acusado Romualdo Eustáquio, o "Japonês", após conseguir adiar pela enésima vez a sua chance de provar que é inocente, saiu jogando as mãos para o alto e clamando por justiça divina. Eu digo Amém, só que nós da família de Maria Nilce queremos a justiça terrena também! Não posso emitir juízo, quem tem que fazer isso é a justiça no dia 06 de novembro, mas, esse tal "Japonês" parece ser uma daquelas pessoas, que vez por outra vemos até em filmes, que quando jovem se meteu com a "bandidagem" e fez um bocado de coisas erradas; depois deu sorte de sobreviver ao passar dos anos - muitos de sua época não conseguiram - constituiu família, empreendeu um negócio e se estabeleceu como "pessoa de bem" e agora parece pensar não ter mais que responder pelos erros que cometeu no passado. É uma situação triste, sua família estava presente no júri prestando apoio. Agora, o grande culpado de toda essa situação é o sistema judiciário brasileiro - e o próprio acusado com as protelações que conseguiu - porque o tal Japonês deveria ter sido julgado há mais de 20 anos e até hoje isso não aconteceu. Inocente ou culpado? Quem vai determinar é a justiça.

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