domingo, 12 de junho de 2011

Um borgiano dia dos namorados (Ariel Palacios)

“Louvado seja o amor em que não há possuidor nem possuída, mas os dois se entregam” dizia o escritor argentino Jorge Luis Borges.
Aproveitamos o dia dos namorados para colocar uma série de poemas de amor, comentários feitos em entrevistas e pensamentos esparsos sobre o amor e a paixão pronunciados pelo escritor argentino Jorge Luis Borges.
Nesta terça-feira completam-se 25 anos de seu falecimento em Genebra. Estão convidados a voltar ao blog nesse dia, para ver uma ampla postagem sobre o autor de “O Aleph”.

O AMOR, SEGUNDO BORGES

Apaixonar-se é criar uma religião cujo deus é falível. “O Encontro com Beatriz”, 1949
Vale a pena ser infeliz muitas vezes para ser feliz um minuto. Petit, 1980.
Estar apaixonado é perceber o único que há em cada pessoa, esse único que não pode se comunicar a não ser por meio de hipérboles ou de metáforas. “Assim escrevo meus contos”, 1981
Apaixonar-se é produzir uma mitologia particular e fazer do universo uma alusão à única pessoa indubitável. Contraviento, 1984.
Parece que esta época tem se afastado de todas as versões do amor…parece que o amor é algo que deve ser justificado, o que é raríssimo, porque a ninguém se lhe ocorre justificar o mar, ou um pôr do sol, ou uma montanha: não necessitam ser justificados. ABC, 1986.

POEMAS

O ENAMORADO 1977
Luas, marfins, instrumentos, rosas,
Lâmpadas e a linha de Dürer,
As nove cifras e o mutável zero,
Devo fingir que no passado foram
Persépolis e Roma e que uma areia
Sutil mediu a sorte da ameia
Que os séculos de ferro desfizeram.
Devo fingir as armas e a pira
da epopeia e os pesados mares
Que roem da Terra os pilares.
Devo fingir que há outros. É mentira.
Só tu és. Tu, minha desventura
E minha ventura, inesgotável e pura.

TWO ENGLISH POEMS 1964
To Beatriz Bibiloni Webster de Bullrich
The big wave brought you.
Words, any words, your laughter; and you so lazily
and incessantly beautiful. We talked and you
have forgotten the words.
(…)
Your profile turned away, the sounds that go to
make your name, the lilt of your laghter;
these are illustrious toys you have left me.
(…)
I must get at you, somehow: I put away those
illustrious toys you have left me, I want your
hidden look, your real smile – That lonely,
mocking smile your cool mirror knows.
II
What can I hold you with?
I offer you lean streets, desperate sunsets, the
moon of the jagged suburbs.
(…) I offer you explanations of yourself, tehories about yourself, authentic and surprising news of yourself.
I can give you may loneliness, my darkness, the
hunger of my heart; I am trying to bribe you
with uncertainty, with danger, with defeat.

A ESPERA

Antes que toque a apressada campainha
E abram as portas e entres, oh esperada
Pela ansiedade, o universo tem
que ter executado uma infinita
série de atos concretos.
Ninguém pode computar essa vertigem,
a cifra daquilo que multiplicam os espelhos,
de sombras que se alongam e regressam,
de passos que divergem e convergem.
A areia não sabia numerá-los.
(Em meu peito, o relógio de sangue mede
O temerário tempo da espera).
Antes que chegues,
Um monge tem que sonhar com uma âncora,
Um tigre tem que morrer em Sumatra,
Nove homens têm que morrer em Bornéu.

LE REGRET D’HERACLITE
Eu, que tantos homens tenho sido, nunca fui
aquele em cujo amor desfalecia Matilde Urbach.
Gaspar Camerarius, em Deliciae Poetarum Borussiae, VII,16.

FRAGMENTOS DE UN EVANGELIO APÓCRIFO (ELOGIO DE LA SOMBRA)

50. Felizes os amados e os amantes e os que podem prescindir do amor.

AS MULHERES, SEGUNDO BORGES

É uma sorte que existam; e existem quase mais do que eu. São seres muito mais práticas. Bienek, 1965

Imaginar uma mulher é um ato de fé. Milleret, 1970

No século XIX, Ibsen assombrou toda a Europa com sua “Casa de Bonecas”. Nessa comédia, Nora Helmer deixa seu lar para viver sua própria vida. Em Paris tiveram que lhe acrescentar um amante para que essa decisão não fosse um escândalo. Em Londres e em Berlim, fizeram que se arrependesse e voltasse à casa.

Sou, evidentemente, feminista. É uma insensatez não sê-lo. Nos Estados Unidos ser feminista é algo que não exige explicações. Em nossa América ainda há muito que fazer. Para um homem há algo mágico em todas as mulheres. Montenegro, 1983

Muitos mais sensatas que os homens e a prova está na história universal. Oscar Wilde tinha razão ao dizer que o universal era uma série de crônicas policiais. Em todas essas crônicas – guerras, conflitos, confrontos, etc. – a mulher foi sempre mais sensata que o homem. Conde, 1985

Em uma entrevista perguntaram a Borges:

“Que imagem tem das mulheres?”
Borges respondeu: “A mesma que todo mundo…A mulher é algo tão vago, são tão diferentes uma das outras, não se pode generalizar”.

“Apesar de meus 82 anos, elas continuam a ocupar (um lugar em minha vida), porque, de uma maneira ou de outra, a gente se sente jovem (…)com a idade os homens perdem a capacidade de amar. Com a idade eles perdem a capacidade de mentir. Mas eu não perdi, com a idade, a capacidade de me surpreender com tudo”.

Se enganam aqueles que pensam que não conheci o amor. Posso afirmar que tenho vivido enamorado. O primeiro amor (ideal, certamente) de minha vida foi uma atriz, Ava Gardner. Costumava ver seus filmes duas vezes por dia. Tão logo terminava a sessão, desejava que chegasse o dia seguinte para voltar a vê-la. O amor exige provas. Provas sobrenaturais. (Peicovich, E. 1988, 27)
Adolfo Bioy Casares disse, após a morte de Borges que seu amigo “passou a vida enamorado, sofrendo muitíssimas vezes”, No entanto, não aceitava levar o amor para a literatura. “Borges tinha uma postura quase puritana contra o amor”.

BÔNUS TRACK
“Enamorar-se é criar uma religião cujo deus é falível”.

“Infinitamente existiu Beatriz para Dante; Dante, muito pouco, talvez nada, para Beatriz”. ( Do prólogo à Divina Comédia. Buenos Aires, 1949).

“A amizade não é menos misteriosa que o amor e que qualquer das outras facetas desta confusão que é a vida”. “O Informe de Brodie” (1970)

“O matrimônio é um destino pobre para a mulher” (1980)

“O coito é aquele momento da felicidade em que cada um é dois, a união em que nos perdemos logo no sonho” (1980).

“Escrevi “Ulrica”, um conto de amor, porque agora posso fazê-lo; porque perdi o pudor” (1980).

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