quinta-feira, 23 de junho de 2011

Ação de Lula abrevia o governo Dilma (Rosângela Bittar)

O governo, que já vinha envelhecendo precocemente pela irresistível vocação apolítica das suas principais autoridades, vai tangenciando uma zona de maior risco à medida que cresce a percepção de parlamentares e, sobretudo, governadores, de que, reiteradamente, apesar dos incompletos seis meses de gestão, a presidente Dilma Rousseff não tomou gosto o suficiente para disputar um segundo mandato. Assim sendo vai se formando o vácuo, e como ele assim não fica por muito tempo, aparecem no horizonte os primeiros sinais da corrida para preencher os vazios.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está absoluto na frente. Perde-se no tempo a ideia, difundida durante a campanha eleitoral de 2010, de que Lula não pensaria voltar a disputar a Presidência se o governo que criou para sucedê-lo estivesse, no momento da definição, dando certo.

Os acontecimentos do mundo real só comprovam que, dando certo ou não lá na frente, agora não está dando, e o ex-presidente não se sentiu constrangido a sentar-se no trono da perspectiva de poder, diante do qual formam-se as filas do beija-mão.

Os sinais do momento indicam que Lula não vai ligar para momento certo algum, e não há, na sua equipe, quem esteja preocupado em fazer o cotejo entre a prática de hoje e os argumentos construídos para provar, durante a disputa, que o de Dilma não seria um governo de transição. Um soluço, apenas enquanto Lula adquirisse condições legais para disputar um terceiro e até um quarto mandato.

Os fatos mostram aos políticos que começou a corrida sucessória e, embora discreta, recolhida aos seus afazeres, sem partir para qualquer tipo de enfrentamento, a presidente se mostra cada vez mais conformada, ou combinada, com a missão de fazer a travessia.

A atividade política do ex-presidente Lula não deixa sombra de dúvida. Depois de rápidas férias ao deixar o governo, iniciou, e não parou mais, uma frenética agenda de reuniões partidárias, palestras que lhe dão projeção nacional e internacional, assessoria profissional para mantê-lo no proscênio, retomada das rédeas do PT, autoria de decisões que impõe goela abaixo de seus seguidores. A investida governo Dilma adentro, sem qualquer cuidado, para tentar enquadrar a crise Palocci em moldura de menor desgaste, mostra como o ex-presidente se vê à vontade no antigo papel.

Lula não se contem, não espera, demonstra que ainda se sente o presidente, queixa-se de saudade, admite que não desencarna, e há pelo menos duas semanas voltou a atuar - a pretexto de esquentar o PT para as eleições municipais - em um circuito de palanques tão fortes quanto os montados em campanhas eleitorais.

Na parada mais recente, retomou inclusive um de seus assuntos prediletos quando tem em mãos o microfone e fala a auditório petista: o ataque à mídia e a pressão sobre as autoridades para que enquadrem a imprensa em regras de controle. O ex-presidente vem novamente insuflando, no discurso, como é do seu feitio, os que não fazem debate de ideias. Tem intensificado seu périplo pelo país e pelo mundo e, claro está, suas reuniões político-eleitorais não se limitam às públicas e ruidosas.

"Se a Dilma enfrentar mais um problema sério, como a crise Palocci, e continuar agindo contra a política, vamos assistir a uma romaria a São Bernardo..." Essa equação, formulada por um aliado fiel da presidente e do ex, tem o tom de alerta sobre algo que já está existindo. Há políticos que estão preferindo procurar Lula para a montagem do futuro.
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Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília.

FONTE: VALOR ECONÔMICO (22/06/11)

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