quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Para analistas, coalizão 'suja' dificulta faxina

Segundo eles, mudanças têm esbarrado na governabilidade, que depende das alianças e da divisão de cargos

Alessandra Duarte

CAXAMBU (MG).Um governo que passou a ser associado à faxina, mas tem de conciliá-la com alianças "sujas" justamente para funcionar. Para cientistas políticos e sociólogos presentes ao 35º Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), em Caxambu (MG), a queda do quinto ministro da presidente Dilma Rousseff por denúncias de irregularidades é um sinal da contradição do governo atual entre uma imagem de limpeza e uma coalizão não tão limpa assim.

"Uma tentativa de combinar governo limpo com política suja" foi a definição dada pelo professor da Universidade de Brasília (UnB) Luis Felipe Miguel.

Segundo Miguel, o governo Dilma, apesar de ter mostrado "mais intolerância" com a corrupção do que seu antecessor, precisaria lidar com disputas que passaram a ocorrer mais dentro do arco de alianças:

- É disputa por fatias de poder do Estado - afirmou Miguel. - O que o governo tem feito é dizer: "A gente afasta a corrupção do Executivo, pune, mas ao mesmo tempo a governabilidade depende do apoio dos partidos, que depende da concessão a congressistas, que depende do loteamento de cargos". O PT abandonou sua trajetória de tentar criar novas formas de fazer política.

Dilma tenta um "divórcio ético" do governo Lula

Também apontando para as disputas dentro das próprias alianças do governo, o cientista político Renato Lessa, da Universidade Federal Fluminense (UFF), afirmou que estariam aí os motivos para a onda de crise nos ministérios de Dilma:

- Não é porque aumentou a investigação, ou porque aumentou a sensibilidade social para esse tipo de conduta, mas porque algo não foi cumprido em algum lugar, aí vêm as denúncias.

- Com menos partidos, poderia haver governabilidade com alianças mais reduzidas. Não haveria essa loteria dos ministérios que se tornou a ocupação das pastas - avaliou o sociólogo do Iesp/Uerj Glaucio Soares, destacando que Dilma tenta fazer uma espécie de "divórcio ético" com o antecessor.

- Há um divórcio ético entre o presidente que saiu e a que entrou, que se reflete na não aceitação por parte da presidente atual de deslizes, talvez crimes.

Professor de Ciência Política da Universidade Federal de Santa Catarina, Yan Carreirão diz que o mal maior, na crise no Esporte, não seria o governo dar o comando da pasta para um partido, mas ter entregado a pasta inteira "de porteira fechada":

- Convidar para participar de ministérios partidos que são de sua coalizão é algo que ocorre em outros países democráticos. O que parece ter acontecido, porém, ao longo do governo Lula e continuando agora, é a prática do ministério de porteira fechada. E, aí, o governo passa a ter menos controle sobre o que acontece no ministério. Um caminho para melhorar esse quadro, além de compor um ministério não só com indicações partidárias mas também pelo conhecimento técnico, é tentar o fim dessa prática da porta fechada - disse Carreirão, para quem "seria mais prudente" que o substituto de Orlando Silva não seja do PCdoB: - As denúncias não foram só contra ele, mas contra a sigla.

Para Renato Lessa, trocar o partido que conduz o do Esporte não teria o efeito de livrar a pasta de novos esquemas de corrupção - pelo fato de que o problema principal não está no PCdoB, mas no próprio modelo de funcionamento do governo:

- É um sistema de coalizão que leva a uma política predatória, de apropriação. Nesse sistema, o PCdoB passou a se comportar como mais um partido. Agora, é a vez dele. Mas é da lógica dessa coalizão que esse tipo de conduta ocorra. Faz parte do modelo do experimento político brasileiro atual, que é a grande coalizão, com um número de ministérios inteiramente desproporcional às necessidades práticas do governo.

O abandono, pelo PCdoB, de seu perfil histórico ideológico também foi destacado por Glaucio Soares:

- O PCdoB acabou no Araguaia. O que se tem agora é um monte de contador de histórias. Nesse presidencialismo de coalizão, os ministérios foram partidarizados, e este (Esporte) caiu nas mãos de um partido bem ruizinho, que agora tem uma área que passa a ter importância, pelos eventos que o Brasil sediará (Copa e Olimpíadas). Hoje, a implantação do que é fisicamente necessário para esses eventos está atrasada. Se não melhorar, o atraso fica irremediável.

FONTE: O GLOBO

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