Acabei de dizer que pesquisar o passado é para mim uma compulsão, mas não é bem isso, não é bem assim. Às vezes é simplesmente uma obrigação com minha própria história, um dever de casa que tenho que fazer. São questões pessoais que preciso me apropriar para tentar entender a partir da realidade e não da memória que, em casos como o do meu saudoso pai, por exemplo, vinham sempre conectadas com uma certa fantasia.
Estava tentando – ainda estou – localizar um ponto geográfico do tempo e resolvi pesquisar a partir dos vestígios da memória que tinha. Minha família havia viajado, então deveria ser um feriado prolongado. Era férias e fazia calor, então devia ser início de ano, mas nem isso agora é certo. Fomos de carro e Danny Boy havia gravado para mim uma fita da banda Queen que eu só conhecia por causa da propaganda com a música Bicycle Race e do Greatest Hits I que trazia Love of My Life.
Eu tinha ganhado um Walk Man moderno e metido a besta, ouvia nele Beatles sem parar, porque o João Lennon havia morrido o que ocasionou uma nova onda daquela banda do Edu Henning que alguns de vocês devem bem conhecer. A partir dessas memórias pude dar um chute com relação ao ano: 1983. Danny teimou em gravar um monte de músicas do Queen que eu não conhecia e que estava certo em dizer que eu deveria conhecer: Father to Son é uma das que mais gosto até hoje.
Passamos por Petrópolis, papai fez uma tremenda barbeiragem e mamãe deu um piti danado. Nós do banco de trás que não havíamos entendido a razão do escândalo ficamos putos com Dona Maria que, afinal, se alterava com tanta freqüência que, hoje suspeito, precisasse da coisa pra viver. O papai era meio barbeirão mesmo e apesar de tudo voltamos inteiros para casa, mas por aqui as coisas não andavam tão bem assim: era sobre isso que eu pesquisava em 90 edições de A Gazeta de 1983.
As notícias são tão parecidas com as de hoje... É impressionante como inúmeras tragédias acontecem todos os dias, pessoas morrendo de forma violenta, de várias maneiras: acidentes de carro, briga de gangues, marido alcoolizado esfaqueia mulher, pescador se afoga e por aí vai... Fico pensando no que foi feito dessa gente, da dor dos que ficaram. Era época do famoso bandido Edmilson Cândido do Rosário, uma espécie de inimigo numero um da sociedade que, curiosamente, não era da política.
Ouvíamos discos de vinil, alguns eram raridades que quando emprestados evaporavam nas mãos do incerto paradeiro. Emprestar discos pra Muralha#, por exemplo, era algo muito perigoso. Sem saber dizer não para ninguém o cara costumava emprestar discos e coisas que já tinha pegado emprestado de outras pessoas, em pouco tempo não sabia mais dizer o que é que estava com quem. É como o fato que agora estou pesquisando, o paradeiro incerto, o desaparecimento, a muito provável destruição do único acervo do Jornal da Cidade.
(Continua na semana que vem...)
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