"A hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude."
Tava
falando de hipocrisia na Crônika anterior e, conversa vai conversa vem,
lembrei do Carambola, uma das figuras mais divertidamente hipócritas
que já conheci. Como já dizia o Grilo Falante, o rapaz “trabalhava a
questão da diversidade sexual”, mas não assumia isso pra senhor ninguém,
nem mesmo para a namoradinha que descolou no cursinho pra “dechavar”.
Davam longos amassos apaixonados na arquibancada da quadra da escola,
foram até advertidos para pegar leve na conduta indecente.
Carambola
adorava usar o termo “dechavar”, era gíria de malandro da época e
apesar de estar com uns trinta anos ainda adotava o estilo “garotão”.
Era um cara enorme, marombado e boa pinta a ponto das mocinhas
suspiravam à sua passagem, mas ele gostava mesmo era de trocar idea com a
rapaziada. Circulava a bordo de um sonoro carrão importado - privilégio
tirado a elite no passado - e dominava qualquer assunto de macho: desde
futebol aos lançamentos “de sacanagem” recentes.
Dechavar,
segundo o Dicionário Informal é “Termo usado para designar qualquer
ação reparadora seguida a uma outra presumidamente inaceitável ou
condenável, com o intuito de disfarçar ou despistar.” É ferramenta
verbal dos hipócritas assumidos que nem o Carambola. Descobrimos isso
quando ele contava suas últimas aventuras...
- Ontem de noite eu saí com um bróder meu. Fomos prum lugarzinho dechavado tomar umas cervejas...
- Ora Carambola, você não disse que não estava mais bebendo? – Sua resposta foi muito tranquilizadora.
-
Num esquenta que ninguém me viu bebendo não. - Nem tampouco importava
saber-se-lá-o-quê que rolava entre ele e o bróder-bofe, a ponto de irem
procurar um “lugarzinho dechavado”pra se esconder (namorar?)...
Sempre
em busca de uma explicação lógica para preservar a identidade secreta,
Carambola dizia que o tal amigo era um “sócio”, mas não conseguia
disfarçar o maior entusiasmo que demonstrava pelo rapaz do que pela
namoradinha. Quando chegou o feriadão da semana santa deu-lhe uma doida,
pegou o bofe (cujo?) e se pirulitou (e como!) pro sul da Bahia. Ao seu
álibi de masculinidade restou o nobre consolo de estudar para o simulado
e garantir a média de desconto na mensalidade.
De
volta do feriadão, com a cara de pau que Deus lhe emprestou e a
namorada saudosa novamente a tiracolo, Carambola levou as fotografias da
viagem pra galera ver. Era um álbum escancaradamente romântico dele e o
“sócio” na piscina da pousada, na intimidade do quarto, tomando
drinques coloridos no barzinho, passando bronzeador na praia. A
sequência menos levemente bandeirosa de todas era dos dois andando de
moto nas dunas e nessa mesma é que a máscara caia:
- Rapaz, a gente andou tanto de moto que eu tô com a bunda toda doída até agora!
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