Manifesto Político
Somos um país soberano e independente, mas com pouca capacidade de interferir nos
foruns e mercados globais. Um país rico, livre e plural, mas com graves indicadores
de violência, desigualdade e pobreza. Somos a sétima economia do mundo, mas não
conseguimos dar educação de qualidade e garantir bom atendimento de saúde para
todos.
Estamos sempre atrás de respostas e não vemos o que temos de melhor para
encontrá-las: a diversidade étnico-cultural de nosso povo, o domínio sobre parte
considerável da biodiversidade e da água doce do planeta, um território de extensão
continental com uma rica variedade de biomas cujo papel é fundamental no equilíbrio
climático e no desenvolvimento científico, tecnológico e econômico de nosso país e do
mundo.
Temos avançado com perseverança na construção da democracia brasileira.
Superamos uma ditadura militar de mais de duas décadas, aprovamos o impeachment
do primeiro Presidente eleito sob a redemocratização, debelamos um processo
inflacionário arrasador que parecia não ter fim e iniciamos importante trajetória de
redução das desigualdades sociais que ainda marcam nossa sociedade.
Prevalece, contudo, a mesma concepção de crescimento. Continuamos insistindo num
modelo econômico que não consegue transformar em estratégia de desenvolvimento
nossa privilegiada condição de detentor de um patrimônio ambiental único.
É significativo que as instituições políticas e os sucessivos governos, nas últimas
décadas, não tenham absorvido e dado relevo ao papel crucial da sustentabilidade
ambiental dentro do processo de desenvolvimento. A exploração dos recursos naturais
segue sendo predatória, com baixa agregação de valor e uso intensivo de agrotóxicos.
Esta é uma realidade que não diz apenas de questões ambientais. Ela aponta para um
equívoco de visão cujas dimensões precisam ser melhor compreendidas.
Uma das peças-chave para uma correção de rumos está no sistema político e sua
estreita relação com o modelo de desenvolvimento. Basta, para isso, ver quais são os
principais doadores de campanha e as leis feitas pelos eleitos, que com frequência
fortalecem os valores que se contrapõem ao desenvolvimento sustentável, à ética, à
justiça, ao aprofundamento da democracia e aos princípios civilizatórios básicos.
São graves os problemas relacionados ao desgaste e ao descrédito da política, dos
políticos e do sistema de representação, sobretudo porque afastam grande parcela da
sociedade das decisões públicas, quando não a leva ao alheamento e total indiferença
às decisões políticas. Permanecem hegemônicas as velhas práticas políticas que
vêm do colonialismo, do populismo, do racismo, do totalitarismo e outras formas de
dominação e corrupção que ainda configuram uma cultura arraigada e difícil de mudar.
O processo de construção da nossa república ainda está incompleto.
Mesmo sendo da natureza dos partidos políticos o confronto de posições e projetos e
a disputa legítima pelo poder de Estado para realizá-los, o objetivo de permanecer no
poder a qualquer custo os esvazia de suas premissas fundantes que são corresponder
aos clamores e urgências da população e expressar as demandas da sociedade, de
forma democrática, competente, ética e justa.
Nosso sistema político-partidário, a pretexto de gerar condições de governabilidade,
enredou-se numa lógica própria fisiológica de formação de base de apoio parlamentar,
solapando cada vez mais as possibilidades de emergirem diferentes e verdadeiros
projetos de desenvolvimento que se ofereçam como alternativas à escolha dos
cidadãos e cidadãs. A maioria dos programas são feitos sob medida para os períodos
eleitorais, sem compromisso real de implementação, tangidos pelo carisma de nomes
e pelo imediatismo das palavras de ordem escolhidas por esquemas cada vez mais
caros e sofisticados de marketing.
Passada a eleição, o poder fecha-se para a sociedade, empurrando-a para o passivo
lugar de mera expectadora do processo político. Ao mesmo tempo, começa a preparar
a composição de forças para as próximas eleições, com base na distribuição de cargos
e vantagens, como se ainda estivéssemos nas capitanias hereditárias. A teórica
separação dos poderes dá lugar à exacerbada predominância do Executivo e da União,
num regime com ranços imperiais, assentado sobre uma noção de governabilidade
que se traduz na repartição dos pequenos, médios e grandes poderes, prerrogativas
e orçamentos de Estado, tornando inviáveis políticas públicas com organicidade,
planejamento, integração e visão de longo prazo.
Essa prática, que se vende como inexorável, interage com o poder econômico,
consolidando a cultura viciosa de tolerância do uso privado dos bens públicos e
levando a insuportáveis distorções na aplicação dos recursos financeiros, tecnológicos,
naturais e humanos do Brasil. O interesse público fica refém do poder econômico, do
calendário político e das conveniências e acordos de bastidores. Chegamos a um ponto
perigoso de relativização ética e de aceitação, como naturais, de práticas lesivas à
sociedade.
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