domingo, 17 de julho de 2011

SALINGER - UMA VIDA

Pesquisa retrata aspectos sombrios da vida de Salinger

JOCA REINERS TERRON
ESPECIAL PARA A FOLHA

A vida de J.D. Salinger (1919-2010) após seu isolamento em Cornish, cidadezinha de New Hampshire, foi uma incógnita.
A não ser pelas revelações magoadas (e portanto pouco fiáveis) de sua ex-amante Joyce Maynard (em "Abandonada no Campo de Centeio", Geração Editorial) ou das memórias de sua filha Margaret ("Dream Catcher: a Memoir", inédito no Brasil), pouco se sabia do ermitão.
A biografia "Salinger -Uma Vida", de Kenneth Slawenski, ilumina aspectos antes sombrios da existência de um dos maiores heróis literários do século 20.
As motivações que levam uma figura pública como Salinger a se isolar e a deixar de produzir (ou ao menos de publicar) podem ser comparadas às de um suicida que não deixa bilhete de despedida.
Diante desse enigma, Slawenski (que se tornou conhecido por seu site www.deadcaulfields.com) explorou o desenvolvimento da obra para desvendar a vida, num movimento contrário ao de biografias tradicionais. O recurso seria questionável, não fosse Salinger o biografado.
A partir da análise dos contos iniciais, publicados em populares revistas como "Collier's" e "Esquire", entre outras, e nunca reeditados, Slawenski relata as causas do retraimento futuro do escritor, como o malfadado final de relacionamento com sua paixão de juventude, Oona O'Neill, e a mágoa por tê-la perdido para Charles Chaplin (36 anos mais velho que ela, com quem foi casado até a morte).
Também aponta as frustrações de Salinger em seu relacionamento com mentores como Whit Burnett, seu descobridor, além das rusgas com editores.
Principalmente, comenta a participação dele como sargento do 12º Regimento de Infantaria na Segunda Guerra Mundial.
Salinger esteve presente no Dia D e em algumas das piores batalhas da invasão da Alemanha. O fato de que o regimento do qual fazia parte perdeu cerca de 70% de seu contingente em junho de 1944 dá uma ideia dos horrores pelos quais o escritor passou.
Mesmo assim, em meio à lama da trincheira, ele não deixou de escrever e de negociar a publicação de suas histórias. O célebre suicídio de Seymour Glass -alter ego de Salinger- após retornar da guerra, no conto "Um Dia Ideal para os Peixes-Banana", apenas antecipou seu sumiço da agenda inóspita do mundo a partir de 1965, data do último texto conhecido do autor.
JOCA REINERS TERRON é autor de "Do Fundo do Poço se Vê a Lua" (Companhia das Letras).

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