Aos 60, Glauco ainda quer escandalizar
Escritor lança "Tripé do Tripúdio", reunião de contos inspirados nos sonetos que escreveu depois de ficar cego
Selo Demônio Negro também comemora aniversário do autor, com caixa reunindo dez livros de poesia
MARCO RODRIGO ALMEIDA
DE SÃO PAULO
Aos 60 anos, completados em 29 de junho, Glauco Mattoso parece ter entrado, enfim, para o chamado "panteão literário".
O iconoclasta da poesia marginal dos anos 1970 é tema de tese, conferências e homenagens. Pela primeira vez, lança um livro de ficção, "Tripé do Tripúdio - E Outros Contos Hediondos", por uma editora de destaque no mercado, a Tordesilhas.
O selo Demônio Negro acaba de lançar a "Biblioteca Mattosiana", caixa de luxo com dez livros que reúnem sonetos que Glauco fez nos últimos anos.
Estaria enganado, contudo, quem pensasse que a idade e o prestígio apaziguaram o antigo furor do poeta.
"Fiquei mais disciplinado formalmente, mas não na temática. Acho que até radicalizo ainda mais hoje os meus temas 'negros'", conta.
Basta uma rápida passada de olho pelos contos de "Tripé do Tripúdio" para concordar com ele. Estão lá perversões sexuais, torturas, obsessões por pés e chulé.
As 25 histórias que compõem o livro são inspiradas nos próprios sonetos de Glauco, que é também personagem de muitas delas.
A passagem dos versos livres e iconoclastas do início da carreira para a forma rígida do soneto foi consequência da cegueira.
Glauco apresentou desde pequeno um quadro congênito de glaucoma.
Nascido Pedro José Ferreira da Silva, ele adota, desde 1974, o pseudônimo Glauco Mattoso, trocadilho com a doença. A cegueira completa veio em 1995.
Foi quando pensou que nunca mais poderia escrever.
A salvação veio quando descobriu um programa de computador que reproduz em som o que ele digita.
"Minha poesia era muito visual. Depois que perdi a visão, me sentia preso numa jaula. Minha saída foi a memória. Foi aí que descobri as formas clássicas do soneto."
Numa das contradições que tanto agradam ao poeta, a fase mais produtiva da carreira dele começou depois da cegueira. Glauco já escreveu mais de 4.500 sonetos desde o final dos anos 1990.
Considerado recordista mundial em número de sonetos, lançou o "Tratado de Versificação" (2010), referência no estudo de poesia.
"Estarei, espero, numa espécie de panteão, mesmo.
Mas, digamos assim, num panteão mais porco e iconoclasta", brinca ele.
TRIPÉ DO TRIPÚDIO
AUTOR Glauco Mattoso
EDITORA Tordesilhas
QUANTO R$ 42,50 (218 págs.)
BIBLIOTECA MATTOSIANA (DEZ VOLUMES)
AUTOR Glauco Mattoso
EDITORA Demônio Negro/Annablume
QUANTO R$ 350 (1.992 págs.)
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