quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Do Movimento de estudantes e do direito de reivindicar (Roberto Beling)

Querer comparar o Movimento Estudantil dos "anos de chumbo" com o Movimento Estudantil dos dias de hoje é começar falsificando uma historia que ainda está sendo escrita.
O post acima, que "tuitei" hoje, apenas quer lembrar que não se deve misturar alhos com bugalhos, nem ...... Querer confundir gestos e palavras, atos e fatos, conceitos e valores de contextos diferentes não passa de puro estelionato intelectual e político. Manipulação grosseira da história e tentativa de instrumentalização de contextos passados para legitimar o contexto presente.

Querer usar categorias únicas para realidades distintas é coisa de quem conhece a luta política dos anos 60 e 70 apenas pela literatura, e, pior, literatura de qualidade questionável ou, talvez, pelas novelas de "época" do SBT. Não se pode confundir, sob pena de falsidade ideológica, o contexto de uma ditadura com supressão do Estado de Direito e domínio fundado na violência como forma de governo, com o regime democrático, por contraposição, fundado no Estado de Direito e no livre exercício das liberdades políticas.
Para a geração que hoje faz o movimento estudantil, a ditadura é coisa do passado, conhecida pelos livros e relatos. É coisa que terminou há 20 anos atrás, portanto, quando quase todos não eram nem nascidos. É experiência vivida para a maioria pelos seus avós, ou seja, quem já é sessentão e já carrega a carteira de idoso no carro para usar estacionamento preferencial (coisa, álias,que já providenciei).
Para contextualizar: referência a dois autores. Contexto: governo Médici. Caracterização: anos de chumbo.
Segundo Bóris Fausto, um dos maiores historiadores brasileiros, o governo Médici foi "um dos períodos mais repressivos, se não o mais repressivo da história brasileira". Segundo Élio Gaspari, autor de uma das maiores obras de cunho jornalísitico sobre o período, no seu antológico "A Ditadura Escancarada", abordando a questão das organizações que optaram pela luta armada, "no final de junho de 1970, estavam desestruturadas todas as organizações que algum dia chegaram a ter mais de cem militantes. Restava apenas um líder de destaque, o Capitão Lamarca, que se embrenhara no interior da Bahia e cedo ou tarde seria capturado. Questão de tempo".
Dá de comparar a cenas e cenários dos contextos do hoje?

Goste-se ou não, situação ou oposição, contra ou a favor, nada elide o fato de o governo Casagrande, - assim como qualquer um dos governos constituidos após 1982 -, é um governo legalmente estabelecido, legitimamente eleito pela população. Governo fundado no Estado de Direito, nas disposições constitucionais de uma sociedade democrática e não no arbítrio e na violação das liberdades fundamentais. Comparar atos e fatos do presente (governo Casagrande) a cenas e cenários do passado (regime militar) é produto de mente fantasiosa ou desinformada ou, o que é pior, mera leviandade intelectual.
As situações vividas no presente, - resultado do legítimo direito do movimento de estudantes contra o aumento das tarifas do transporte coletivo -, tem que ser trabalhadas no seu devido contexto, e o que temos nesse contexto é uma situação de impasse derivada do confronto entre dois Direitos.
Isso existe? Existe.
Temos de um lado, o Direito a livre manifestação de reivindicações políticas, sindicais, econômicas ou sociais; de outro, a responsabilidade e obrigação do Estado de assegurar os direitos difusos do conjunto da população, traduzidos no direito de ir e vir, no direito de chegar ao seu local de trabalho, de ter acesso a equipamentos de educação e saúde ou, simplesmente, chegar em casa depois de um dia exaustivo de trabalho.
Como se resolve esse aparente paradoxo do contrato democrático? Resposta óbvia e ululante: pela via dos procedimentos que configuram a ordem democrática. A democracia é um conjunto de procedimentos que regulam e institucionalizam os conflitos. E por que? Para que não sejamos presa do Estado Hobesiano, do todos contra todos, do homem como o lobo do próprio homem. E a institucionalização e regulação dos conflitos pressupõe a existência do confronto mas também diálogo e negociação. E o produto desse processo pode ser exatamente a negociação dos espaços públicos para o exercício desses direitos.
A democracia é a expressão da vontade da maioria na esfera da escolha dos governantes. No campo das relações sociais é o direito a existência e a expressão das minorias, sejam políticas, étnicas, de genero e opção sexual, religiosas e assim por diante. Nessas minorias, a expressão de determinadas categorias sociais que são parte e não o todo. O que não se pode conceber é transformar a expressão do direito de reivindicar de determinados grupos ou setores em rotinas e persistência de atos que representam o cerceamento dos direitos dos outros que constituem a maioria.
Qual a dificuldade do governo, partidos e movimentos sociais institucionalizarem espaços das manifestações democráticas?
E, finalmente, aquilo que é, tem que ser chamado por aquilo que é. Incendiar ônibus, colocando em risco a integridade física ou a vida de inocentes, é apenas uma coisa, e coisa pelo que tem que ser chamada: VANDALISMO.
Roberto Beling

2 comentários:

  1. Nada a ver, o movimento estudantil de hoje, com o de "ontem". O vandalismo, é falta de educação ( o governo está devendo essa...).

    Quanto à Democracia, só vai ser mesmo plena, quando o voto não for obrigatório.

    Um abraço, Roberto

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  2. Sim, a Democracia é um "conjunto". Não é só uma medida, ou uma decisão. Mas um detalhe: para chegarmos perto dela, muitos vandalismos virão, até que a vergonha se esgote e a luta seja séria.

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