Apagões pequenos, médios e grandes, do Oiapoque ao Chuí; epidemia grave de dengue; mortes novamente por catástrofes da natureza esperadas mas não prevenidas por governos municipais, estaduais e sobretudo federal, a quem compete muito; caos aéreo persistente, resultado de incipientes medidas; erros repetidos na administração da Educação; baixa execução de PACs I ou II; reforma agrária sem resultados; invisível avanço em desempenho na área de segurança. Problemas, esses e muitos outros, do primeiro ano do governo Dilma, todos, de gestão.
A presidente da República gastou seis meses iniciais na montagem do governo e os seis meses finais na desmontagem. Perdeu, na tessitura, dois pilares, Antonio Palocci, chefe da Casa Civil, e Nelson Jobim, ministro da Defesa, dois mais importantes colaboradores. Titubeou, demorou, negaceou, até trocar ministros política e administrativamente inviabilizados nos cargos, levando o governo à paralisia. Quando tomou providências o fez de forma acanhada - pois ainda há áreas no vácuo -, e já era o fim da primeira etapa.
Isso não influiu na popularidade, na capacidade de reeleição, no apoio popular, como citam governistas profissionais, a provar que a aceitação é prova de que o governo foi bom. Não se pode dizer, porém, para o bem do realismo, que se o mau governo não atingiu o voto, não existiu. Com altos índices de aprovação no último Ibope do ano, maior até que seus antecessores no mesmo período, Dilma seria reeleita gloriosamente se o pleito fosse hoje. Mas não poderá dizer que recebeu, para isso, contribuição decisiva de sua performance de gestora, fama que adquiriu já na equipe de transição do governo Lula, antes até de ser ministra.
O governo começa o segundo ano no mesmo ponto que começou o primeiro: tendo que ser remontado, exigindo nomeação de ministros que possam ter competência para executar programas que a presidente venha a apontar como seu projeto de Brasil. Em janeiro de 2012 estão todos no ponto do janeiro de 2011: à espera de que ela diga a que veio e para onde vai.
Dilma terminou em empate, inclusive, no quesito de preservação da democracia e das instituições, ainda necessitadas de cuidados especiais no Brasil. Para cada avanço, houve um retrocesso. Iniciativas como a criação da Comissão da Verdade, ou mudanças dos princípios de política externa para preservar o respeito aos direitos humanos, por exemplo, tiveram seu contraponto na censura a programas de TV e peças de propaganda ensaiadas sem pudores pela ministra da Mulher, Iriny Lopes, e na pressão do partido presidencial, o PT, para que promova o controle da imprensa. Houve outras ameaças que não chegaram a configurar risco real, mas promessas de autoritarismo, como o abuso do governo por medidas provisórias, o que anula o contraditório do Congresso, e renovadas tentativas de eliminar controles do Tribunal de Contas da União.
A timidez administrativa da presidente inibiu até mesmo o grupo criado para ajudá-la a romper o imobilismo da gestão do Estado, a Comissão de Gestão Pública. Jorge Gerdau, empresário coordenador do grupo que levaria para o governo os instrumentos modernos de administração na iniciativa privada, não logrou resultados. O grupo não deu respostas sobre como melhorar a gestão de áreas de administração difícil e, às vezes, dramática, como a da saúde e, principalmente, dos hospitais públicos. Nem da educação, uma gestão perdida entre erros administrativos repetidos, por exemplo, na aplicação de exames nacionais, e equívocos da política universitária expansionista que criou instituições fantasmas pelo interior afora.
O problema é que esses setores de gestão em colapso têm se tornado numerosos, a eles se somando a segurança, o combate ao uso de drogas, a prevenção de desastres ambientais, o abastecimento de energia.
A oposição, se disse neste espaço ao fim de 2011, foi um fracasso retumbante no ano em que deveria se renovar e reafirmar um projeto alternativo para o eleitorado. O governo não ficou à frente, embora, ao contrário da oposição, que nem número teve, contasse com os instrumentos para fazer e acontecer.
O ministério foi formado para atender ao projeto do ex-presidente Lula de preparar candidatos de cara nova para o PT disputar eleições municipais e estaduais. Deu errado no federal, e pode continuar nessa má trilha a julgar-se pelas especulações que cercam a substituição dos ministros candidatos. A troca de Fernando Haddad por Aloizio Mercadante - e não vai aqui nenhum lobby das corporações que lotearam o MEC a favor do secretário-executivo (Henrique Paim) e candidato preferencial de Haddad - continua dentro do projeto de formação de candidatos do PT a eleições traçado por Lula.
As corporações, que governam por intermédio de conferências, ONGs e greves, por sinal, tomaram mais de uma das áreas fundamentais para o sucesso do projeto deste governo. Na saúde tentou-se estabelecer base de alguns programas novos, voltados para a classe média, segundo orientação expressa da presidente, mas foi incipiente. Exemplo de fim de linha nesse setor acontece na porta do governo federal. Brasília, governada pelo PT, que tem na saúde o problema mais grave entre tantos, continua mergulhada na incompetência e falta de perspectiva de soluções. A última do governador Agnelo Queiroz foi criar o ciclo-socorro, as "bikelâncias" que, como o nome indica, são isso mesmo, ambulâncias em bicicleta. Não se tem notícia de reações de perplexidade, terror ou providências no Ministério da Saúde.
O governo parece amarrado, impedido. Com esse fraco e pouco criativo desempenho, Dilma está no topo das pesquisas de popularidade, apoio e aceitação do eleitorado, repetem como um mantra seus acólitos. O ex-presidente Lula já disse, nos idos do pós-mensalão, que um governo começa mesmo no terceiro ano, portanto, esse início não conta. O pior dos mundos será a marquetagem convencer Dilma da desnecessidade de reações firmes neste segundo ano.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Valor Econômico (11/01/12)
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