terça-feira, 1 de novembro de 2011

Espírito Santo face a oligarquização e a vontade única ou unanimismo.

O artigo de Roberto Garcia Simoes em A Gazeta dessa terca, 1ª de novembro, é leitura obrigatoria para aqueles que insistem em manter acesa a chama da Democracia no Espírito Santo.
Comentando a tentativa de elevar a candidatura Paulo Hartung a condição de candidato único (ou quase), diz o articulista:
a) se vitorioso esse projeto "a eleição vira, ..., uma mera formalidade: o voto confirma na urna o que já foi confirmado nas cúpulas. Institui-se um simulacro de democracia".
b) "Com a megacoligação, a (quase) candidatura única extinguiria os riscos e as incertezas da competição democrática".
c) "Nessa nomeação antecipada do prefeito, outro candidato não passaria de anticandidato. Ambas lembram o regime autoritário pós-64. Para que campanha e propaganda?".
d)"Unidade não significa extirpar diferenças, aniquilando oposições - substituindo-as por "descontentamentos". Muito menos formatar um pensamento único que constrange oposições".
e) "O Espírito Santo seria pioneiro na constituição do monopólio político-eleitoral fora dos regimes totalitários".
f) E, conclue com um chamamento a resistência: "a opinião pública democrática precisa resgatar a "democracia real" - um clamor nas manifestações em todo o mundo".
A denúncia dessa ameaça autoritária não é nova no debate político capixaba, alguns a chamaram de "unanimidade bonapartista", outros a definiram como "emasculação da política" e outros como "vocação autoritária tardia", pura e simplesmente.
É uma questão complexa e ameaçadora, Remete a possibilidade de cristalização e consolidação de uma oligarquia política que poderá transformar nosso estado em uma capitania hereditária ou simples feudo a exemplo do triste, famoso e célebre exemplo do Maranhão. A esse respeito, vale a pena assistir o documentário dirigido por Glauber Rocha (consulte o índice do Blog) para ver que não basta uma imagem de juventude e modernidade para garantir que o produto não será uma ordem política obscurantista e atrasada.
Esse projeto em curso, de uma ordem fundada no "unanimismo" tem paralelos em outros momentos da história brasileira ou latinoamericana.
No meu último curso sobre "Realidade do Espírito santo", na UFES, procurei traçar um paralelo entre essa ordem em gestação e a experiência da República Velha com o seu padrão de dominação oligárquica e a chamada "Política dos Governadores".
Naquela quadra de nossa história, as políticas nos estados eram controladas pelas oligarquias locais, o principio que vigorava era o do "aos amigos tudo, aos inimigos os rigores da Lei", ser oposição podia ser um crime de lesa majestade e as eleições eram devidamente fraudadas e manipuladas.
Fraudades ou manipuladas, não importa. O objetivo era assegurar a vitória da situação e evitar os riscos e incertezas de uma competição democrática. A função da eleição era homologar escolhas e decisões prédeterminadas.
Prédeterminadas? Sim, a eleição de um presidente era apenas o produto de uma operação entre oligarcas. Reunidos em almoço, no então aristocrático Joquei Clube da então Capital da Repúblicado, os Presidentes de Províncias em acordo com o Presidente da República escolhiam o nome a ser eleito a Presidência. A eleição era mera formalidade. Ungido o escolhido, o papel das eleições era apenas assegurar a
homologação do nome do escolhido. Parafraseando Aristide Lobo, ao povo cabia assistir bestializado todo o processo.
Hoje, não é preciso levantar os mortos para votar, montar os currais ou resolver no bico de pena. Hoje, não é possível fraudar urnas eletrônicas (ao menos assim penso), mas é possível pelas artes e manhas do controle do poder, da privatização e apropriação partidária do estado ou da construção de coalizações organizadas em torno da busca pura e simples da preservação do poder, construir-se um processo em que a competição política torna-se apenas um exercício proforma.
Danem-se os pruridos de consciência (como diria o velho Jarbas Passarinho por ocasião da edição do Ato Institucional nº 5), remetam-se as considerações ideológicas apenas ao plano do discurso (ficam as referências ao socialismo e a outras ismos a manipulação ideológica), esqueçam-se as distincões demodes de esquerda e direita, a preservação do poder torna-se o fim último e único do exercício da política.
E, nesse processo, a eleição passa a ser apenas um mal necessário. Exigência formal da qual nem o regime autoritário implantado pelos militares teve coragem de suprimir, mas que pode ser contornado pelos acordos de cúpula e concertação de interesses entre os dirigentes partidários. Se há uma voz dissonante deve ser neutralizada, isolada e, se possível, politicamente exterminada.
E, assim, assegura-se uma nova ordem, fundada no "unanimismo", na versão capixaba do antigo modelo soviético do "partido único", agora transmutado na forma de "vontade única".
PS.: no twitter comentei o artigo estabelecendo um paralelo com o que já foi denominado processo de "Mexicanização" da política brasileira. Como muita gente me perguntou o que era mexicanização, talvez na próxima desenvolva esse tema.

Um comentário:

  1. Unanimismo é quase um elogio,pois poderia representar a manifestação de posições mais autênticas,ideológicas e desalienadas em determinadas épocas especiais.O que não é o caso dessa anomalia abjeta que é a política capixaba,e que Vitória não foge à regra.
    Parabéns, professores,pela brilhante percepção.
    Luiz Leoncio lorenzoni

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