A concepção política de um governo Jair Bolsonaro, em fase de formulação, segue a seguinte fórmula: "Será um governo baseado em aliança de centro-direita, que vai resgatar a dívida social pelo fortalecimento da economia de mercado", diz uma fonte ligada ao candidato líder na preferência do eleitorado.
O que isso significa, concretamente?
Significa aproveitar politicamente essa grande maioria que chegará ao Congresso, de tendência de centro-direita, para fazer tramitar os projetos mais urgentes, respeitando a manifestação de preferência do eleitorado por um tipo de relação mais avançada com deputados e senadores.
A primeira aposta dos políticos da campanha é na guilhotina da cláusula de barreira, que ocorrerá no ano que vem. O PSL, com 56 deputados, é o segundo da Câmara mas poderá passar a ser o primeiro recebendo filiações do PRP, do Avante, do PRTB e até de alguns partidos da esquerda mais leves que também ficarão pelo caminho a partir de fevereiro, como o Rede, por exemplo. O PCdoB, o PCO, o PSTU também não cumpriram as exigências da lei eleitoral, mas esses dificilmente deixarão de fazer oposição ao novo na bancada da esquerda.
São 14 os partidos que deixarão de ter existência parlamentar e, portanto, ficarão sem fundo partidário no período de 2019 a 2023, e sem acesso ao tempo gratuito de propaganda. Muitos, para sobreviver, devem ingressar em outras agremiações e, sendo o partido do presidente, o PSL deve ser um porto natural para um grande contingente de desabrigados.
Mas o PSL, sozinho, mesmo turbinado, não pode fazer muito. Há outros instrumentos nesse método em gestação. Argumenta-se, na campanha, que há vários governos o partido do presidente da República não faz mais que 20% do Congresso, daí a necessidade de adotar o presidencialismo de coalizão que, no Brasil, transformou-se em cooptação, em negociação de cargos, emendas, verbas e outras trocas do mesmo caráter.
Jair Bolsonaro terá que negociar com outros partidos para formar a aliança de centro-direita. Seu ministro da coordenação política, o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) já está começando as conversas. Não se vai fugir desse tipo de negociação. O que deve mudar é a forma, o conteúdo e a relação.
A eleição deu ao Congresso um conteúdo político-ideológico nítido e, ficou evidente, mais permeável a um governo Bolsonaro do que eventualmente a um governo do PT, argumentam políticos que darão assessoria ao futuro governo.
Várias previsões de analistas políticos não se realizaram, entre elas a assertiva de que, donos do dinheiro do fundo partidário, os caciques dos partidos, a cúpula que se eterniza no poder de cada sigla, dariam as cartas da eleição, repassando mais dinheiro para os seus candidatos favoritos. O PSL elegeu 56 deputados e não tinha dinheiro nem seu presidente tinha visibilidade ou força para distribuir qualquer coisa.
Imaginava-se inquestionável o poder de Roberto Jefferson (PTB), de Valdemar da Costa Neto (PR), de Romero Jucá (PMDB), de Ciro Nogueira (PP) e tantos outros dirigentes nacionais. O modelo que se discute agora, pelos políticos que fazem a concepção do governo Bolsonaro, é uma negociação não com os partidos na "vertical", mas com os partidos na "horizontal", as frentes parlamentares temáticas.
A Frente da Agricultura, por exemplo, já derrubou um ministro antes mesmo de ser nomeado, não quer Luiz Antonio Nabhan Garcia e vai indicar outro se Bolsonaro vencer as eleições. Os evangélicos e a bancada da bala, a aliada mais natural entre todas, terão interlocução privilegiada em tudo. E, afirma-se, a bancada do funcionalismo público tem também nichos para Bolsonaro, por exemplo, os deputados e senadores com patentes militares, com títulos da polícia, oriundos da carreira do Ministério Público e outras categorias de controle, todos nesse novo clima centro-direita do país.
Segundo as fontes com acesso às discussões do governo Bolsonaro, o clamor das ruas retratado nas urnas não é bom para as cúpulas partidárias. A relação com o Parlamento, em princípio, será com as frentes, embora não se vá desconhecer os partidos e seus caciques.
Outro ângulo da composição da aliança vai depender também de uma travessia da fase que tem sido chamada de "extrema adrenalina dos novatos". Um parlamentar do PSL, do Novo, ou mesmo de velho partido, eleito pela primeira vez na vida e logo a deputado federal, vai chegar a Brasília imbuido de uma autoimportância que transparecerá. Pode exigir mundos e fundos, até mesmo a presidência da Câmara e presidência do Senado. É preciso deixar a realidade se impor.
O baixo clero, do qual também fazia parte o próprio Onyx, vai querer se colocar e, quem sabe, até, não se vingar dos maus tratos, mas o equilibrio virá, é como se vê o modelo na campanha de Bolsonaro.
Mesmo com uma negociação assim definida, Bolsonaro não deixará de fazer nomeações com base em indicações políticas. A renovação não foi total, os experientes no ofício não nasceram ontem e vão valorizar-se. Mas não serão poucas as áreas inegociáveis, para as quais o presidente terá uma estratégia específica.
Por exemplo, o Ministério da Defesa. É um cargo que Bolsonaro guarda para o general Augusto Heleno, não porque ele seja um especialista em tecnologia de armamentos. Apesar de ter perfil no grupo mais próximo para ocupar posto mais elevado, foi escolhido para a Defesa porque vai desempenhar um papel muito mais importante.
Fontes do futuro governo, se Bolsonaro vencer, informam que o general Heleno foi escolhido porque "tem autoridade moral para dentro". Como os militares vão sentir-se com muito poder, tal como os deputados do PSL, é necessário alguém com bom diálogo na tropa e muito equilibrio para evitar repetições de episódios desagradáveis para o governo, como foram as declarações do general Mourão, candidato a vice-presidente de Bolsonaro, para a campanha.
Valor Econômico
17 de outubro de 2018
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