O bolsonarismo como movimento político está refluindo, e Bolsonaro tenta compensar isso com golpe de Estado e uso da máquina.
Os bolsonaristas inteligentes sabem que a eleição de 2018 foi uma mistura de contingências que não devem se repetir: a facada, a desistência de outsiders como Joaquim Barbosa e Luciano Huck, a prisão de Lula, o casamento entre bolsonarismo e lavajatismo, o naufrágio das candidaturas ligadas a Temer. Essa onda atraiu as elites econômica e política para Bolsonaro nas últimas semanas do primeiro turno. Agora a onda refluiu e o sistema busca alternativas.
O voto puramente antipetista parece ter abandonado Jair. Sua taxa de aprovação é semelhante à proporção do eleitorado que o apoiava antes da disparada no primeiro turno.
É cada vez menos claro o que, exatamente, Bolsonaro tem a oferecer como programa econômico que seus concorrentes na direita não tenham. Suas únicas propostas que não estavam nos programas de Alckmin e Meirelles —a capitalização da Previdência e a CPMF— foram fracassos constrangedores. Se você gosta de ortodoxia econômica, é pouco provável que Bolsonaro seja sua única alternativa de voto em 2022.
A propósito, os dois principais governadores eleitos na onda bolsonarista —Doria e Witzel— já tentam se afastar de Bolsonaro.
E já não é mais possível para a centro-direita repetir o argumento de que Bolsonaro seria moderado pelas instituições, ou que o PT traria o mesmo risco à democracia. Não há nenhum outro político ou partido brasileiro que, se tivesse vencido, teria criado o mesmo risco permanente de golpe de Estado instaurado por Bolsonaro. Se o empresariado apoiar Bolsonaro de novo, sua ruptura com a democracia será consciente e final.
Mas mesmo os 25% de aprovação de Bolsonaro não são estáveis. A chance de Bolsonaro representar a Lava Jato de novo na eleição é zero. Já está claro que Bolsonaro está tendo muito mais sucesso em destruir as instituições de combate à corrupção do que seus antecessores.
Os procuradores da Lava Jato já denunciaram Bolsonaro como adversário. A permanência de Moro no ministério é cada vez mais constrangedora. Essa percepção mal começou a chegar à opinião pública.
Sobram os fanáticos de Olavo de Carvalho e Eduardo Bolsonaro, mas seu extremismo sobreviveu muito mal à atenção do público. Quando o Brasil parou para ler Olavo e escutar Eduardo, só sobrou vergonha. O olavismo só sobrevive como senha para conseguir cargos de segundo escalão nas áreas do governo controladas pelos extremistas.
Resta a máquina. O aparelhamento bolsonarista das instituições segue acelerado, e o uso da máquina contra os adversários do governo —em especial os de direita— mal começou. O esforço para cooptar mídia amigável é aberto e desavergonhado. É usando a máquina que o PSL espera conquistar mil prefeituras no ano que vem.
E é justamente porque o movimento está refluindo que Bolsonaro acelerou o golpismo. Em menos de dez dias tivemos o "levantar a borduna", os ataques à imprensa e o tuíte de Carlos Bolsonaro. Querem isolar seus militantes do noticiário e mantê-los radicalizados.
Não é o primeiro caso em que um movimento autoritário radicaliza quando começa a perder. O risco pode ter aumentado.
Folha de S. Paulo/16 de setembro de 2019
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