quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Vitoria mais do que esperada (Murillo de Aragão)

Murillo de Aragão



Existe uma séria e permanente incompatibilidade entre o que o Congresso espera e o que o governo oferece, reduzindo o exercício da política a um mero toma lá dá cá

05/02/2015 
A derrota do governo nas eleições para a presidência da Câmara dos Deputados, no último domingo, era mais do que esperada. A princípio, imaginava-se que haveria disputa, mas quem conhece as entranhas da Câmara sabia que Arlindo Chinaglia (PT) jamais poderia ser eleito. Podemos alinhar um bom número de motivos para explicar o que aconteceu, gostaria, porém, de explorar dois. 

Primeiro, seu mandato como presidente (2007-2009) não deixou simpatias nem na máquina burocrática da Casa nem no baixo clero. Segundo, as articulações feitas pelo governo mais desestabilizaram do que agregaram competitividade à sua candidatura.

Já Eduardo Cunha (PMDB) tinha a seu lado, na largada da campanha, para o que desse e viesse, mais de 100 deputados de partidos diversos. Eram aliados conquistados pacientemente nos últimos anos. Essa lista crescia a cada desfeita da coordenação política do Planalto. A ponto de alguns importantes líderes afirmarem que a liderança do deputado carioca beneficiou-se diretamente da penosa relação da presidente Dilma Rousseff (PT) com o Congresso.

Muitos parlamentares com larga experiência no Legislativo acham que a inteligência política do Executivo foi se tornando, aos poucos, muito débil. Concordo. Por exemplo: a atuação dos ministros que fazem a articulação política não visa à construção de uma relação de confiança e sim à resolução de problemas pontuais, do momento, que são muitos e com grande potencial de conflito.

De certa forma, o governo não está à vontade para operar o modelo brasileiro de poder, o chamado presidencialismo de coalizão. Assim, existe uma séria e permanente incompatibilidade entre o que o Congresso espera e o que o governo oferece como modelo de coalizão, reduzindo o exercício da política a um mero toma lá dá cá.

Após o episódio de domingo, dois caminhos se abrem. Um seria decorrente do efeito pedagógico da derrota: o governo reconhecer que deve mudar sua forma de atuar politicamente. Em termos ideais: buscar reforçar o diálogo com os partidos e suas lideranças; compatibilizar a relação entre presença no Congresso e presença nos ministérios; abortar iniciativas que visam desestabilizar a base, tais como a criação de novos partidos a fim de desidratar aliados. O outro caminho será insistir no mesmo modelo e correr novos riscos, o que parece descartado a partir do telefonema da presidente em que cumprimentou Cunha pela vitória.

Pouco depois de assumir, o novo presidente da Câmara anunciou que trabalhará com uma agenda de votações que desagrada ao Poder Executivo. Ao mesmo tempo, disse que espera a nomeação de Henrique Eduardo Alves (PMDB) para algum ministério o mais rápido possível. A mensagem de Cunha foi clara.

Em nome do governo, Aloizio Mercadante replicou anunciando que cargos dependem de votação, ou seja, estabeleceu um padrão de negociação. Tanto Cunha quanto Mercadante sabem que vão ter de negociar. E todos em Brasília sabem que o campo dessa negociação será a nomeação para cargos de segundo escalão “nobre”. 

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