O Brasil vive um paradoxo: é uma democracia presidida por um líder autoritário que, por palavras e atos, despreza os valores básicos da ordem democrática. Até por isso, está na ordem do dia avaliar quem e quantos são os bolsonaristas de raiz —aqueles que apoiam incondicionalmente o chefe.
Com o cientista político Fernando Guarnieri, do Iesp-Uerj, analisamos resultados das pesquisas de intenção de voto feitas pelo Datafolha no ano das eleições. Em junho de 2018, quando a campanha não começara, Bolsonaro era o preferido de 17% dos entrevistados.
À época, o eleitor típico do capitão era homem, jovem (25 a 34 anos), branco ou amarelo, com renda familiar entre 20 e 50 salários mínimos, evangélico, empresário ou autônomo regular, morador das regiões norte, sul e centro-oeste. A probabilidade de um cidadão com esse perfil declarar-se disposto a votar em Bolsonaro beirava os 90%.
Já em outubro, na última pesquisa realizada imediatamente antes do primeiro turno o índice subiu para 95%. Ou seja, praticamente todos os eleitores com tais características pretendiam votar no candidato do PSL. Esse parece ser o núcleo duro do bolsonarismo.
Marcos Coimbra, diretor do Instituto Vox Populi, em artigo publicado na revista Carta Capital, chega a conclusão semelhante quanto ao porte dessa parcela do eleitorado —embora divirja sobre as suas características sociais. "Os encantados com o capitão", assinalou, "são predominantemente mais velhos e ricos".
Dias atrás, este jornal publicou informações coletadas pelo Datafolha nos últimos meses e que permitem avaliar o apoio da população às posições mais extremadas de Bolsonaro. Elas revelam que aproximadamente 1/3 dos entrevistados —número semelhante aos dos seus eleitores no primeiro turno e dos que continuam a apoiá-lo— acredita que a política ambiental prejudica o desenvolvimento, que o governo deve reduzir as áreas destinadas às reservas indígenas, que o golpe de 31 de março de 1964 deve ser comemorado e que a posse de armas deveria ser um direito. Na mesma linha, pouco menos de 1/3 concorda que a segurança seria maior se a polícia matasse mais suspeitos e, enfim, que o Brasil deve dar preferência aos Estados Unidos em comparação com outros países.
Em suma, focalizando apenas o núcleo inicial dos adeptos do capitão, constituído por homens brancos de renda alta, ou o grupo mais amplo que hoje forma a sua base de apoio, a extrema direita é minoria. Minoria, porém considerável, que parece ter vindo para ficar e é suficiente para levar seu candidato ao segundo turno em 2022. Seja ele o próprio Bolsonaro ou outro "mito" qualquer.
(*) Maria Hermínia Tavares de Almeida, professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.
Folha de S. Paulo/8 de agosto de 2019
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