Sempre é importante ver o conjunto, considerar as distintas variáveis, as personalidades e seus estilos, as correlações de força, buscar as determinações e as contradições que se chocam em processo.
Todo governo faz o que faz não só por seus eventuais méritos ou pela brisa suave e generosa que recebe das circunstâncias, mas também pelo que não faz a oposição a ele.
Michel Temer está no palco com um lote de propostas e procedimentos que desagradam a oposição (especialmente a de esquerda) e colidem, ao menos supostamente, com os interesses da população.
Apesar disso, tem conseguido avançar. Em parte porque tem o apoio da maioria do Congresso e a torcida tolerante de parcela importante da população. O ambiente geral também lhe é favorável. Mas não é só isso. Vai em frente porque não tem oposição, porque aqueles que se opõem a ele somente o fazem em termos retóricos e performáticos, sem conseguir marcar presença ativa nem no centro do sistema político, nem no centro da sociedade civil.
É uma oposição que rosna, mas não morde. Que se alimenta de discursos antagonistas vazios, preenchidos por cenas de protestos ruidosos mas ocos, montados meio improvisadamente e sem alma popular. Bate-se cabeça por qualquer coisa, grande ou pequena que seja. É uma oposição desacorçoada, sem unidade de pensamento e ação, que para justificar sua inoperância termina por inflar a bola do governo, ao apresentá-lo não como coisa dos homens, mas como encarnação viva do demônio e das forças malignas do capitalismo e da “austeridade neoliberal”.
Enquanto permanecer agarrada à denúncia do “golpe” e da “usurpação”, xingando e vaiando Temer, torcendo para seu governo não dar certo e atribuindo a ele a culpa por males que vem de governos anteriores, a oposição ficará a girar em círculos, prisioneira de sua fraqueza e de suas fantasias. Na melhor das hipóteses, ajudará a legitimar aquilo que gostaria de inviabilizar.
Uma oposição fundamentalista e primitiva, que se move por ódio e ressentimento, ou, quando vem pela direita, por interesses mesquinhos e fanáticos, é tudo o que a democracia não precisa no Brasil de hoje.
(*) Marco Aurélio Nogueira é professor titular de teoria política na Unesp
Fonte: O Estado de São Paulo (04/02/17)
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