Entre fusões e novas criações vivemos
um verdadeiro paradoxo de representação política na organização partidária da
democracia no Brasil. Explico. Acompanhamos atentamente a movimentação político-partidária
em torno da criação de uma nova sigla no Brasil, a Rede Sustentabilidade (Rede)
e, também, da fusão de outras duas siglas, com relativa expressão, que
originarão a Mobilização Democrática (MD). Os defensores desses dois mais
recentes movimentos têm atribuído suas ações a “um desejo legítimo de exercitar
as garantias democráticas”, ou seja - pelo menos em tese - revigorar as opções e
possibilidades democráticas; fortalecimento democrático-partidário; ampliação
da participação direta da população nas decisões públicas; oxigenação das bases
e estruturas políticas; renovação da cultura política brasileira; recolocação da
política a serviço do bem comum, etc.. Enfim, novas possibilidades podem
representar um ganho verdadeiro para a democracia e para o "fazer
política" no País.
Logo, senão em algumas, em pelo
menos uma coisa todos os apreciadores da democracia, que conheço, concordam: a
ampliação do debate político, com novas e variadas opções de representação, é sempre
salutar e benéfica ao processo democrático.
Portanto, novas opções
partidárias deveriam ser do interesse do conjunto de nossa população. E por que
não são? A resposta talvez esteja no paradoxo mais capilar em que vive a
democracia brasileira.
Ao mesmo tempo em que há um crescente
interesse por vias de participação social mais democráticas, temos acompanhado
um verdadeiro declínio da importância dos partidos nas democracias
contemporâneas. Alguns anunciam esse fenômeno como uma profunda "crise da
democracia". Segundo o cientista
social Manuel Castells o que por alguns tem sido entendido como "crise da
democracia" é o declínio das relações de identidade entre representantes e
representados e a mudança para um novo modelo político. Afinal, a lógica de
organização atual dos partidos políticos os têm tornado meros instrumentos a
serviço de alguns poucos. Práticas como: a organização partidária em feudos
políticos; o fisiologismo na ocupação de cargos públicos; o clientelismo nas
relações políticas; a corrupção entranhada nas instâncias partidárias; etc.,
têm tratado de intensificar uma crise de intermediação e representatividade
sócio-política dos partidos no Brasil.
Esse sentimento tem sido
confirmado nas pesquisas de estudo eleitoral, como é o caso da respeitadíssima pesquisa
de abrangência internacional ESEB, que é um estudo vinculado ao projeto
internacional Comparative Study of Electoral Systems (CSES), coordenado pela
Universidade de Michigan e com a participação de dezenas de instituições de
vários países. A ESEB 2006, no Brasil, que foi coordenada em parceria com
pesquisadores da UNICAMP, demonstrou que quase 70% da população brasileira
entende que nenhum partido político representa a sua maneira de pensar.
Essas evidências demonstram que
há um divórcio crescente entre os partidos e a sociedade e, portanto, o fim da
centralidade dos partidos políticos. O cientista político francês Bernard Manin
avalia que há uma mudança em curso, a que ele chama de passagem da
"democracia de partidos" para um novo modelo, o da "democracia
de público", ou seja para vias mais acessíveis e democráticas de
participação política.
Para efetivamente buscar a
resolução desse problema, há, em nossa visão, a necessidade de uma mudança
epistemológica do que se vê como problema. Não basta gerar novos partidos ou
fusões partidárias, ao contrário, talvez estaremos reforçando o problema. O
problema está em seu estatuto. Não se trata de mudar a "consciência"
das pessoas (ou seu voto), mas o regime político, econômico e institucional de
produção dessa "verdade" de democracia partidária. É urgente uma
reforma política com candidaturas independentes, sem exigência de filiação
partidária, para quebrar o monopólio dos partidos sobre a vida pública, e para
renovação de representação política.
Em tempos em que as lideranças políticas querem
"um partido para chamar de seu", o fato, é que, entre Redes, MD`s,
etc., a sociedade busca por mais espaços democráticos. Mas será que esse novo
vigor na vida pública virá da movimentação partidária?
Nenhum comentário:
Postar um comentário