.
Que não haja ilusão: a eleição não somou, dividiu - se não fragmentou. Qualquer que fosse o resultado, seria assim. Agora, o desafio para reunir os cacos do diálogo e de algum consenso que a intemperança dos últimos tempos estraçalhou. A oposição poderia ter sinal trocado, mas o mesmo dedo em riste e faca nos dentes, ressentida, esperando a volta. Que não haja ilusão: o pleito definiu o vencedor ao estilo Machado - “ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas”. Esta eleição não termina com a votação: segue hoje e amanhã, com temperatura e pressão elevadas.
A presidente reeleita não é a Dilma de 2010, cercada de boa vontade e esperança. As expectativas a respeito de seu novo governo são defensivas: defender o emprego, a inclusão, o partido; defender o governo. Terá a desconfiança de setores econômicos que não se limitam aos demonizados “banqueiros”. Há a classe média, a mídia, os críticos melindrados. E, claro, um Congresso mais fisiológico e fracionado por interesses diversos, divergentes, difusos, e um governo com menor margem fiscal para saciar apetites fisiológicos.
Atender e recompor a credibilidade demandará morder a língua, desdizer o que se disse, capitular ao inimigo que venceu. Há pouco espaço político para isso, pois a base social, criada e cevada na crença de soluções simples, não compreenderá a complexidade da política, obliterada pelo debate. Dilma não é Sarney, para, no dia seguinte, praticar estelionato e passar o resto do mandato com cara de paisagem. Seus custos e princípios são maiores. Ao mesmo tempo, fazer suavemente o ajuste não contornará os espíritos mais sectários. “Crise” é o nome dessa sinuca.
Os desafios econômicos são grandes, mas os obstáculos políticos são maiores - a política mal manejada pode pôr a perder avanços econômicos. Limitar o necessário ao medíocre possível não é saída. O País pressionará por mudança logo. O desafio requer uma presidente que de modo algum divida a galera em duas torcidas, mas que recomponha a unidade do cristal trincado. Que não haja ilusão, o País carecerá de liderança política de altíssimo nível. A presidente terá de se reinventar.
Fonte: O Estado de S. Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário